Pagina-afbeeldingen
PDF
ePub

XIV

Chamará o Samorim mais gente nova:
Virão Reis de Bipur, e de Tanor,
Das serras de Narsinga, que alta prova
Estarão promettendo a seu senhor:
Fará, que todo o Naire em fim se mova,
Que entre Calecut jaz, e Cananor,
D'ambas as leis imigas, para a guerra,
Mouros por mar, Gentios pela terra.

XV

E todos outra vêz desbaratando,
Por terra e mar, o grão Pacheco ousado,
A grande multidão, que irá matando,
A todo o Malabar terá admirado:
Commetterá outra vez, não dilatando,
O Gentio os combates apressado,
Injuriando os seus, fazendo votos

Em vão aos deoses vãos, surdos, e immotos.

XVI

Já não defenderá somente os passos,
Mas queimar-lhe-ha lugares, templos, casas:
Acceso de ira o cão, não vendo lassos
Aquelles, que as cidades fazem rasas,
Fará, que os seus, de vida pouco escassos,
Commettam o Pacheco, que tem asas,
Por dous passos n'hum tempo: mas voando
D'hum n'outro, tudo irá desbaratando.

XVII

Virȧ alli o Samorim; porque em pessoa
Veja a batalha, e os seus esforce, e anime:
Mas hum tiro, que com zonido voa,
De sangue o tingirá no andar sublime.
Já não verá remedio, ou manha boa,
Nem força, que o Pacheco muito estime:
Inventará traições, e vãos venenos;
Mas sempre (o Céo querendo) fará menos.

XVIII

Que tornará a vêz septima, cantava,
Pelejar com o invicto e forte Luso,
A quem nenhum trabalho peza, e aggrava;
Mas com tudo este só o fará confuso:
Trará para a batalha horrenda e brava
Machinas de madeiros fóra de uso,
Para lhe abalroar as caravelas;

Que atelli vão lhe fôra commette-las.

XIX

Pela a agua levará serras de fogo,
Para abrazar-lhe quanta armada tenha:
Mas a militar arte, e engenho, logo
Fará ser vãa a braveza, com que venha.
Nenhum claro barão no marcio jogo,
Que nas azas da fama se sostenha,
Chega a este, que a palma a todos toma,
E perdoe-me a illustre Grecia, ou Roma;

XX

Porque tantas batalhas, sustentadas
Com muito pouco mais de cem soldados,
Com tantas manhas, e artes inventadas,
Tantos cães não imbelles profligados,
Ou parecerão fabulas sonhadas,
Ou que os celestes córos invocados
Descerão a ajuda-lo, e lhe darão
Esforço, força, ardil, e coração.

XXI

Aquelle, que nos campos Marathonios
O grão poder de Dário estrue, e rende;
Ou quem com quatro mil Lacedemonios
O passo de Thermopylas defende,
Nem o mancebo Cocles dos Ausonios,
Que com todo o poder Tusco contende
Em defesa da ponte, ou Quinto Fabio;
Foi como este na guerra forte e sabio.

A nympha rompe em huma invectiva contra a ingratidão de alguns soberanos e nomeadamente ⚫ contra a El-Rei D. Manuel, que deixou sem recompensa alguã, o prodigioso valor e extraordinarios serviços de Duarte Pacheco Pereira

[ocr errors]

XXII

Mas neste passo a nympha o som canoro
Abaixando, fez ronco, e entristecido,
Cantando em baixa voz, envolta em chôro,
O grande esforço mal agradecido,
O Belizario, disse, que no côro
Das Musas serás sempre engrandecido,
Se em ti viste abatido o bravo Marte,
Aqui tens com quem podes consolar-te!

XXIII

Aqui tens companheiro, assi nos feitos,
Como no galardão injusto e duro:
Em ti, e nelle veremos altos peitos
A baixo estado vir, humilde e escuro:
Morrer nos hospitaes, em pobres leitos
Os, que ao Rei, e á lei servem de muro!
Isto fazem os Reis, cuja vontade

Manda mais, que a justiça, e que a verdade:

Façanhas e morte dos dois heroes Almeidas, D. Francisco, primeiro Vice-Rei da India e D. Lourenço seu filho.

XXVI

Mas eis outro, cantava, intitulado
Vem com nome Real, e traz comsigo
O filho, que no mar será illustrado,
Tanto, como qualquer Romano antigo:
Ambos darão com braço forte, armado,
A Quiloa fertil aspero castigo,
Fazendo nella Rei leal e humano,
Deitado fóra o perfido Tyranno.

XXVII

Tambem farão Mombaça, que se arrea
De casas sumptuosas e edificios,
Co'o ferro e fogo seu queimada e fea,
Em pago dos passados maleficios.
Despois na costa da India, andando chea
De lenhos inimigos, e artificios,

Contra os Lusos, com velas e com remos,
O mancebo Lourenço fará extremos.

O vate estando proximo a concluir o seu poema, Cinvoca pela, ultima vez a Musa dos versos heroicos e maviosamente se lastima de seus desgostos

VIII

Aqui, minha Calliope, te invoco

Neste trabalho extremo; porque em pago
Me tornes, do que escrevo, e em vão pretendo
O gosto de escrever, que vou perdendo.

IX

[ocr errors]

Vão os annos descendo, e já do estio
Ha pouco que passar até o outono:
A fortuna me faz o engenho frio,
Do qual já não me jacto, nem me abono:
Os desgostos me vão levando ao rio
Do negro esquecimento, e eterno sono:
Mas, tu me dá, que cumpra, ó grão Rainha
Das Musas, co'o que quero á nação minha!

Começa a Sirena a sua canção prophetica, celebrando as maravilhosas proezas de Fernão Pacheco Pereira, cognominado o Achilles Lusitano

X

Cantava a bella deosa, que viriam
Do Tejo pelo mar, que o Gama abrira,
Armadas, que as ribeiras venceriam,
Por onde o Oceano Indico suspira:
E que os gentios Reis, que não dariam
A cerviz sua ao jugo, o ferro e ira
Provariam do braço duro e forte,
Até render-se a elle, ou logo à morte:

« VorigeDoorgaan »