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LXXV

Despois que a corporal necessidade
Se satisfêz do mantimento nobre,
E na harmónica, e doce suavidade,
Viram os a'tos feitos, que descobre:
Tethys, de graça ornada, e gravidade;
Para que com mais alta gloria dobre
As festas deste alegre e claro dia,
Para o felice Gama assi dizia:

LXXVI

Faz-te mercê. Barão, a Sapiencia
Sprema, de co'os olhos corporais
Vêres o, que não pode a vã sciencia
Dos errados, e miseros mortais!
Sigue-me firme e forte, com prudencia,
Por este monte espesso, tu, co'os mais,
Assi lhe diz: e o guia por hun mato
Arduo, difficil, duro a humano trato.

LXXVII

Não andam muito, que no erguido cume
Se acharam, onde hum campo se esmaltava
De esmeraldas, rubis taes, que presume
A vista, que divino chão pizava:

Aqui bum globo vêm no ar: que o lume
Clarissimo por elle penetrava.

De modo, que o seu centro está evidente, Como a sua superficie claramente.

LXXVIII

Qual a materia seja, não se enxerga,
Mas enxerga-se bem, que está composto
De varios orbes, que a divina verga
Compoz, e hum centro a todos só tem posto:
Volvendo, ora se abaixe, agora se erga,
Nunca s'ergue, ou se abaixa, e hum mesmo rosto
Por toda a parte tem, e em toda a parte
Começa, e acaba em fim por divina arte:

LXXIX

Uniforme, perfeito, cm si sostido,
Qual em fim o Archetipo, que o creou.
Vendo o Gama este globo, commovido
De espanto e de desejo alli ficou.
Diz-lhe a deosa: O transumpto reduzido
Em pequeno volume aqui te dou

Do mundo aos olhos teus; para que vejas,
Por onde vás, e irás, e o que desejas.

LXXX

Vês aqui a grande machina do mundo,
Etherea, e elemental, que fabricada
Assi foi do saber alto, e profundo,
Que he sempre principio, e meta limitada.
Quem cérca em derredor este rotundo
Globo, e sua superficie tão limada,

He Deos: mas o que he Deos, ninguem o entende;
Que a tanto o engenho humano não se estende.

Thetis, depois de dar ao Gama, á vista do globo exposto aos seus olhos, huma explicação conforme com o errado systema astronomico de Ptolomeu, então geralmente admittido, aponta-lhe differentes reinos, paizes e ilhas principalmente da Africa e da Asia

XCI

Neste centro, pousada dos humanos,
Que não somente ousados se contentam
De soffrerem da terra firme os danos,
Mas inda o mar instabil exprimentam;
Verás as varias partes. que os insanos
Mares dividem, onde se aposentam
Varias nações, que mandam varios Reis,
Varios costumes seus, e varias leis.

XCI

Vês Europa christã, mais alta e clara,
Que as outras em policia e fortaleza:
Vês Africa, dos bens do mundo avara,
Inculta, e toda chea de bruleza,
Co'o cabo, que atéqui se vos negara,
Que assentou para o Austro a natureza:
Olha essa terra toda, que se habita
Dessa gente sem lei, quasi infinita.

XCIII

Vê do Benomotápa o grande imperio,
De selvatica gente, negra e nua,
Onde Gonçalo morte e vituperio
Padecerá pela Fé sancta sua:
Nasce por este incognito bem spherio
O metal, por que mais a gente sua:
Vê que do lago, donde se derrama
O Nilo, tambem vindo está Cuama:

XCIV

Olha as casas dos negros, como estão
Sem portas, confiados em seus ninhos,
Na justiça Real, e defensão,

E na fidelidade dos visinhos:
Olha, delles a bruta multidão,

Qual bando espesso e negro de estorninhos,
Combaterá em Sofala a fortaleza,

Que defenderá Nhaia com destreza:

XCV

Olha lá as alagoas, donde o Nilo
Nasce, que não souberam os antigos:
Ve-lo rega. gerai do o crocodilo,
Os povos Abassis, de Christo amigos:
Olha como sem muros (novo estilo)
Se defendem melhor dos inimigos:
Vê Méroe, que ilha foi de antigua fama,
Que ora dos naturaes Nobá se chama:

XCVI

Nesta remota terra, hum filho teu
Nas armas contra os Turcos será claro,
Ha de ser Dom Christovam o nome seu;
Mas contra o fim fatal não ha reparo:
Vê cá a costa do mar, onde te deu
Meliude hospicio gazalhoso, e charo;
O Rapto rio nota, que o romance
Da terra chama Obi, entra em Quilmance.

XCVIL

O cabo vê já Aromata chamado,
E agora Guardafú, dos moradores,
Onde começa a boca do afamado
Mar Roxo, que do fundo toma as côres:
Este como limite está lançado,

Que divide Asia de Africa; e as melhores
Povoações, que a parte Africa tem,
Maçuá são, Arquico, e Suanquem.

XCVII

Vês o extremo Snéz, que antiguamente,
Dizem, que foi dos Héroas a cidade,
Outras dizem que Arsinoe, e ao presente
Tem das frotas do Egypto a potestade:
Olha as aguas, nas quaes abrio patente
Estrada o gião Moysés na antigua idade:
Asia começa aqui, que se apresenta
Em terras grande, em reinos opulenta.

XCIX

Olha o monte Sinai, que se ennobrece
Co'o sepulchro de Sancta Catharina:
Olha Toro, e Gidá, que lhe fallece
Agua das fontes doce, e crystallina:
Olha as portas do estreito, que fenece
No reino da sêcca Ádem. que confina
Com a serra de Arzira, pedra viva,
Oude chuva dos ceos se não deriva.

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