Pagina-afbeeldingen
PDF
ePub

EXCERPTOS DO CANTO III

Vasco da Gama, satisfazendo aos desejos do rei de Melinde, dispõe-se a esclarece-lo ácerca da situação de Portugal, e a contar-lhe os factos mais importantes da sua historia, fazendo preceder de hum breve preambulo a sua longa narração.

[ocr errors]

Promptos estavam todos escuitando
O, que o sublime Gama contaria :

Quando, despois de hum pouco estar cuidando,
Alevantando o rosto, assi dizia:

Mandas-me, ó Rei, que conte declarando
De minha gente a grão genealogia:
Não me mandas contar estranha historia,
Mas mandas-me louvar dos meus a gloria.

TY

Que outrem possa louvar esforço alheio,
Cousa he, que se costuma, e se deseja :
Mas louvar os meus proprios, arreceio,
Que louvor tão suspeito mal me esteja:
E, para dizer tudo, temo, e creio,

Que qualquer longo tempo curto seja:
Mas, pois o mandas, tudo se te deve;
Irei contra o, que devo, e serei breve.

Alem disso, o que a tudo em fim me obriga,
He não poder mentir no, que disser;
Porque de feitos taes, por mais que diga,
Mais me ha de ficar inda por dizer:
Mais; porque nisto a ordem leve, e siga,
Segundo o que desejas de saber,
Primeiro tratarei da larga terra,

Despois direi da sanguinosa guerra.

Magnifica descripção geographica da Europa

· VI

Entre a zona, que o Cancro senhorea,
Meta Septentrional do Sol luzente,
E aquella, que por fria se arrecea
Tanto, como a do meio por ardente,
Jaz a soberba Europa, a quem rodea
Pela parte do Arcturo, e do Occidente
Com suas salsas ondas o Oceano,
E pela Austral o mar Mediterrano.

VII

Da parte, donde o dia vem nascendo,
Com Asia se avisinha: mas o rio,
Que dos montes Rhipheios vai correndo
Na alagoa Meotis, curvo e frio.

As divide: e o mar, que fero e horrendo
Vio dos Gregos o irado senhorio,
Onde agora de Troia triumphante

Não vê mais, que a memoria, o navegante.

VIII

Lá onde mais debaixo está do polo,
Os montes Hyperboreos apparecem,
E aquelles, onde sempre sopra Eolo,
E co'o nome dos sôpros se ennobrecem :
Aqui tão pouca força tem de Apollo
Os raios, que no mundo resplandecem,
Que a neve está contino pelos montes,
Gelado o mar, geladas sempre as fontes.

IX

Aqui dos Scythas grande quantidade
Vivem, que antiguamente grande guerra
Tiveram sobre a humana antiguidade
Co'os, que tinham então a Egypcia terra:
Mas quem tão fóra estava da verdade,
(Já que o juizo humano tanto erra)
Para que do mais certo se informara,
Ao campo Damasceno o perguntara.

X

Agora nestas partes se nomea
A Lappia fria, a inculta Noroega,
Escandinavia ilha, que se arrea
Das victorias, que Italia não lhe nega:
Aqui, em quanto as aguas não refrea
O congelado inverno, se navega
Hum braço do Sarmatico Oceano,
Pelo Brusio, Suecio, e frio Dano.

Entre este mar, é o Tanais vive estranha
Gente, Ruthenos, Mosèos, e Livonios,
Sarmatas outro tempo, e na montanha
Hircinia, os Marcomanos são Polonios.
Sujeitos ao Imperio de Alemanha

São Saxones, Bobemios, é Pannonios,
E outras varias nações, que o Rheno frio
Lava, e o Danubio, Amásis, é Albis rio.

XII

Entre o remoto Istro, e o claro estreito,
Aonde Helle deixou co'o nome a vida,
Estão os Thraces de robusto peito,
Do fero Marte patria tão querida,
Onde co'o Hemo, o Rhodope sujeito
Ao Othomano está, que sobmettida
Byzancio tem a seu serviço indino:
Boa injuria do grande Constantino!

[ocr errors]

Logo de Macedonia estão as gentes,
A quem lava do Axio a agua fria:
E vós tambem, ó terras excellentes
Nos costumes, engenhos, è ousadia,
Que creastes os peitos eloquentes,
E os juizos de alta phantasia,

Com quem tu, clara Grecia, o ceo penetrás,
E não menos por armas, que por létrás.

[ocr errors]

Logo os Dalmatas vivem, e no seio,
Onde Antenor já muros levantou,
A soberba Veneza está no meio
Das aguas; qué tão baixa começou.

Da terra hum braço vem ao mar, que cheio
De esforço nações varias sujeitou;
Braço forte de gente sublimada,

Não menos nos engenhos, que na espada.

XV

Em torno o cerca o reino Neptúnino,
Co'os muros naturaes por outra parte:
Pelo meio o divide o Apennino,
Que tão illustre fez o patrio Marte:
Mas despois que o Porteiro tem divino,'
Perdendo o esforço veio, e bellica arte:
Pobre está já de antigua potestade:
Tanto Deos se contenta de humildade!

[ocr errors]

Gallia alli se verá, que nomeada
Co'os Cesáreos triumphos foi no mundo.
Que do Séquana, e Rhodano he regada,
E do Garumna frio, e Rheno fundo:
Logo os montes da Nympha sepultada
Pyrene se alevantam, que, segundo
Antiguidades contam, quando arderam,
Rios de ouro, e de prata então correram.

« VorigeDoorgaan »