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Dedicatoria a El-Rei D. Sebastião que ainda não tinha chegado á maioridade

VI

E vós, ó bem nascida segurança
Da Lusitana antigua liberdade,
E não menos certissima esperança
De augmento da pequena Christandade:
Vós, ó novo temor dá Maura lança,
Maravilha fatal da nossa idade,

Dada ou mundo por Deos, que todo o mande;
Para do mundo a Deos dar parte grande:

VII

Vós, tenro e novo ramo florecente
De huma arvore de Christo mais amada,
Que nenhuma nascida no Occidente,
Cesárea, ou Christianissima chamada:
Vede-o no vosso escudo, que presente
-Vos amostra a victoria já passada,
Na qual vos deo por armas, e deixou
As, que elle para si na Cruz tomou :

VIII

Vós, poderoso Rei, cujo alto imperio
O Sol, logo em nascendo, vê primeiro,
Vê-o tambem no meio do hemispherio,
E, quando desce, o deixa derradeiro:
Vós, que esperamos jugo. e vituperio
Do torpe Ismaelita cavalleiro,

Do Turco oriental, e do Gentio,
Que ainda bebe o licor do sancto rio:

IX

Inclinai por hum pouco a magestade,
Que nesse tenro gesto vos contemplo,
Que já se mostra, qual na inteira idade,
Quando subindo ireis ao eterno templo.
Os olhos da Real benignidade

Ponde no chão: vereis hum novo exemplo
De amor dos patrios feitos valerosos,
Em versos divulgado numerosos.

X

Vereis amor da patria, não movido
De premio vil, mas alto, e quasi eterno;
Que não he prémio vil ser conhecido
Por hum pregão do ninho meu paterno.
Ouvi; vereis o nome engrandecido
Daquelles, de quem sois senhor superno:
E julgareis, qual he mais excellente,
Se ser do mundo Rei, se de tal gente.

ΧΙ

Ouvi; que não vereis com vãas façanhas,
Phantasticas, fingidas, mentirosas,
Louvar os vossos, como nas estranhas
Musas, de engrandecer-se desejosas:
As verdadeiras vossas são tamanhas,
Que excedem as sonhadas, fabulosas,
Que excedem Rodamonte, e o vão Rugeiro,
E Orlando, indaque fora verdadeiro.

XII

Por estes vos darei hum Nuno fero,
Que fez ao Rei, e ao reino tal serviço:
Hum Egas, e hum Dom Fuas, que de Homero
A cithara para elles só cobiço.

Pois pelos doze Pares, dar-vos quero
Os doze de Inglaterra, e o seu Magriço:
Dou-vos tambem aquelle illustre Gama,
Que para si de Eneas toma a fama.

XIII

Pois se, a troco de Carlos Rei de França,
Ou de Cesar, quereis igual memoria,
Vede o primeiro Afonso, cuja lança
Escura faz qualquer estranha gloria:
E aquelle, que a seu reino a segurança
Deixou co'a grande, e prospera victoria:
Outro Joanne invicto cavalleiro,

O quarto e quinto Afonsos, e o terceiro.

XIV

Nem deixarão meus versos esquecidos
Aquelles, que nos reinos lá da Aurora
Se fizeram por armas tão subidos,
Vossa bandeira sempre vencedora:
Hum Pacheco fortissimo, e os temidos
Almeidas, por quem sempre o Tejo chora:
Albuquerque terribil, Castro forte,

E outros, em quem poder não leve a morte.

IV

E em quanto eu estes canto, e a vós não posso,
Sublime Rei; que não me atrevo a tanto,
Tomai as redeas vós do reino vosso,
Dareis materia a nunca ouvido canto:
Comecem a sentir o pezo grosso
(Que pelo mundo todo faça espanto)
De exercitos, e feitos singulares,

De Africa as terras, e do Oriente os mares.

XVI

Em vós os olhos tem o Mouro frio,
Em quem vê seu exicio affigurado:
Só com vos ver o barbaro Gentio
Mostra o pescoço ao jugo inclinado:
Tethys todo o ceruleo senhorio
Tem para vos por dote apparelhado ;
Que, affeiçoada ao gesto bello, e tenro,
Deseja de comprar-vos para genro.

XVII

Em vós se vem da Olympica morada,
Dos dous Avós as almas cá famosas,
Huma na paz angelica dourada,
Outra pelas batalhas sanguinosas:
Em vós esperam ver-se renovada
Sua memoria, e obras valerosas,
E lá vos tem lugar no fim da idade
No templo da suprema eternidade.

XVIII

Mas em quanto este tempo passa lento
De regerdes os povos, que o desejam,
Dai vós favor ao novo atrevimento;
Para que estes meus versos vossos sejam :
E vereis ir cortando o salso argento
Os vossos Argonautas; porque vejam,
Que são vistos de vós no mar irado:
E costumai-vos já a ser invocado.

Concilio dos deoses no Olympo ácerca do arrojado commettimento dos Portuguezes, que sob o commando de Vasco da Gama, por ordem de El-Rei D. Manoel, navegavam no largo Oceano para o descobrimento da India

XIX

Já no largo Oceano navegavam,
As inquietas ondas apartando,

Os ventos brandamente respiravam,
Das naos as velas concavas inchando:
Da branca escuma os mares se mostravam
Cobertos, onde as proas vão cortando
As maritimas aguas consagradas,
Que do gado de Próteo são cortadas.

XX

Quando os deoses no Olympo luminoso,
Onde o governo está da humana gente,
Se ajuntam em concilio glorioso,
Sobre as cousas futuras do Oriente:
Pizando crystallino ceo formoso,
Vem pela via Lactea juntamente,
Convocados da parte do Tonante,
Pelo neto gentil do velho Atlante.

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