Fallecimento do glorioso fundador da Monarquia Portugueza
LXXXIII
De tamanhas victorias triumphava O velho Afonso, Principe subido: Quando, quem tudo em fim vencendo andava, Da larga e muita idade foi vencido: A pallida doença lhe tocava Com fria mão o corpo enfraquecido, E pagaram seus annos deste geito A triste Libitina seu direito.
LXXXIV
Os altos promontorios o choraram, E dos rios as aguas saudosas Os semeados campos alagaram, Com lagrimas correndo piedosas: Mas tanto pelo mundo se alargaram Com fama suas obras valerosas, Que sempre no seu reino chamarão, Afonso, Afonso, os eccos: mas em vão.
Proezas do novo Rei D. Sancho 1, e tomada da cidade de Silves, com auxilio de cruzados Flamengos. Conquista de Tui e de outras villas de Galliza pelo mesmo soberano
LXXXV
Sancho forte mancebo, que ficara Imitando seu pai na valentia,
E que em sua vida já se exprimentara, Quando o Betis de sangue se tingia, E o barbaro poder desbaratara Do Ismaelita Rei de Andaluzia,
E mais quando os, que Beja em vão cercaram, Os golpes de seu braço em si provaram:
Despois que foi por Rei alevantado, Havendo poucos annos que reinava, A cidade de Sylves tem cercado, Cujos campos o barbaro lavrava: Foi das valentes gentes ajudado Da Germanica armada, que passava, De armas fortes e gente apercebida, A recobrar Judea já perdida.
Passavam a ajudar na sancta empresa O roxo Federico, que moveo .O poderoso exercito em defesa Da cidade, onde Christo padeceo, Quando Guido, co'a gente em sede accesa, Ao grande Saladino se rendeo, No lugar, onde aos Mouros sobejavam As aguas, que os de Guido desejavam.
Mas a formosa armada, que viera Por contraste de vento áquella parte, Sancho quiz ajudar na guerra fera, Já que em serviço vai do sancto marte: Assi como a seu pai acontecera, Quando tomou Lisboa, da mesma arte, Do Germano ajudado Sylves toma, E o bravo morador destrue, e doma.
LXXXIX
E se tantos tropheos do Mahometa Alevantando vai, tambem do forte Leonez não consente estar quieta A terra, usada aos casos de Mavorte; Até que na cerviz seu jugo metta Da soberba Tui, que a mesma sorte Vio ter a muitas villas suas visinhas, Que por armas tu, Sancho, humildes tinhas.
Morto D. Sancho I, succede-lhe D. Affonso II quc toma aos Mouros (com auxilio estrangeiro) Alcacer do Sal
Mas entre tantas palmas salteado Da temerosa morte, fica herdeiro Hum filho seu, de todos estimado, Que foi segundo Afonso, e Rei terceiro: No tempo deste aos Mouros foi tomado. Alcacere-do-Sal por derradeiro; Porque d'antes os Mouros o tomaram, Mas agora estruidos o pagaram.
A D. Affonso II succede D. Sancho II, o qual havendo-se deixado dominar de seus privados, he despojado do exercicio da soberania
XCI
Morto despois Afonso, lhe succede Sancho segundo, manso e descuidado, Que tanto em seus descuidos se desmede, Que de outrem, quem mandava, era mandado: De governar o reino, que outro pede, Por causa dos privados foi privado; Porque, como por elles se regia, Em todos os seus vicios consentia.
Nem era o povo seu tyrannisado, Como Sicilia foi de seus tyrannos: Nem tinha, como Phálaris, achado Genero de tormentos inhumanos: Mas o reino de altivo, e costumado A senhores em tudo soberanos, A Rei não obedece, nem consente, Que não for mais, que todos, excellente:
Toma conta do governo o Conde de Bolonha, que depois da morte de D. Sancho II, seu irmão, reinou com o nome de Affonso III, e acabou de libertar Portugal do dominio dos Mouros.
Por esta causa o reino governou O Conde Bolonhez, despois alçado Por Rei, quando da vida se apartou Seu irmão Sancho, sempre ao ocio dado. Este, que Afonso o bravo se chamou, Despois de ter o reino segurado, Em dilata-lo cuida; que em terreno Não cabe o altivo peito tão pequeno.
Da terra dos Algarves, que lhe fora Em casamento dada, grande parte Recupera co'o braço, e deita fóra O Mouro, mal querido já de Marte: Este de todo fez livre e senhora Lusitania com força, e bellica arte, E acabou de opprimir a nação forte Na terra, que aos de Luso coube em sorte.
Reinado de D. Diniz, que fundou a Universidade de Coimbra, e mandou edificar muitas villas e fortalezas
Eis despois vem Diniz, que bem parece Do bravo Afonso estirpe nobre e dina, Com quem a fama grande se escurece Da liberalidade Alexandrina:
Com este o reino prospero florece (Alcançada já a paz aurea divina) Em constituições, leis, e costumes, Na terra já tranquilla claros lumes:
Fez primeiro em Coimbra exercitar-se O valeroso officio de Minerva,
E de Helicona as Musas fez passar-se A pizar do Mondego a fertil herva. Quanto pode de Athenas desejar-se, Tudo o soberbo Apollo aqui reserva: Aqui as capellas då tecidas de ouro, Do baccharo, e do sempre verde louro.
Nobres villas de novo edificou, Fortalezas, castellos mui seguros, E quasi o reino todo reformou. Com edificios grandes, e altos muros: Mas despois que a dura Átropos cortou O fio de seus dias já maduros, Ficou-lhe o filho pouco obediente, Quarto Afonso: mas forte e excellente.
« VorigeDoorgaan » |