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Porque reno

Os seus votos

voz o que havia de ser vox clamantis e com os gestos, movimentos, e saltos do corpozinho que só tinha, já começava a prégar que era chegado o Messias: ainda não tinha voz o mais que propheta e já prophetizava quaes haviam de ser os impulsos e empenhos da sua vida: ainda não tinha voz o precursor missionario, e ja ia deante dos nossos mostrando-lhes como o haviam de imitar e seguir. Elle havia de morar no deserto; os nossos pelos maltos e pelos bosques: elle havia de vestir pelles de camelo; os nossos o burel de algodão grosseiro tinto nos tujucos: elle havia de se sustentar de gafanhotos; os nossos até de lagartos: elle havia de matar a sêde com mel silvestre; os nossos com o lodo dos charcos, e com as cacimbas das praias: elle havia de baptizar no pequeno rio Jordão; os nossos no immenso das Amazonas: elle havia de converter homens a que chamou viboras, mas da sua nação e da sua lingua; os nossos a homens que se podem chamar feras em linguas tão estranhas e barbaras como as vozes dos brutos. Para isto bão de sair e partir d'aqui, deixando as capellas doiradas, e os corredores azulejados e os eirados de flores e vistas alegres; sem saudades, sem repugnancias, sem temores, antes com jubilos de alegria e saltos de prazer: Exsultavit infans in utero meo.

Finalmente sobre tudo: Ut facta est vox salutationis tuae: vam os noviços com a voz, com a luz, com a assistencia e com a protecção da deante da San- Virgem Maria, não só protectora e advogada, mas suavissima ctissima Vir- Mãe de todos os noviços da Companhia, que a mesma Senhora

gem.

instituiu. Em sua soberana presença hão de renovar amanhã os seus votos coram sacratissima Virgine Maria. E como todos aqui a servem com tão affectuosos e filiaes obsequios, e a visitam e saudam tão frequentemente todos os dias, não ha duvida que a mesma sacratissima Virgem no dia de sua Visitação os visite e encha de todos os dons e graças do céu, de que encheu o menino precursor no ventre da mãe é a mesma mãe e a toda a casa de Zacharias. Zacharias quer dizer Memoria Domini e que casa ha mais digna deste mome e na qual a memoria de Deus seja o perpetuo exercicio da vida; e a alma de todas as acções mais propriamente, que este sagrado retiro da Companhia de Jesus? Como pode logo o mesmo Jesus deixar de visitar esta casa e trazer a ella sua sanctissima Mãe para ambos sanctificarem as novas e innocentes almas que tão anticipadamente, desde o ventre da mãe, se offerecem e dedicam ao serviço de uma e outra majestade no exercicio que sobre todos mais lhes agrada, qual é o das missões para que se criam? Assim será egualmente sem duvida, por mercê, por privilegio, e por graça propria d'este dia, em que o mesmo Jesus, levado

no purissimo ventre de sua sanctissima Mãe, a levou a sanctificar o seu primeiro missionario com tanta pressa: Exsurgens Maria abiit in montana cum festinatione.

(Ed. ant. tom. 6, pag. 534, ed. mod. tom. 9, pag. 252).

PRACTICA ESPIRITUAL NA FESTA DAS CHAGAS

DE S. FRANCISCO ***

OBSERVAÇÃO DO COMPILADOR.-Esta practica é tirada do sermão que Vieira prégou em Lisboa na egreja da Natividade no anno de 1646 e que é um dos mais extravagantes. Aproveitei alguns pensamentos que são não menos uteis que bellos e ingenhosos: mas foi necessario por de parte o assumpto com toda a argumentação.

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Se alguem quizer alistar-se debaixo das minhas bandeiras, diz Christo Redemptor nosso, ha de negar-se a si mesmo, tomar a sua cruz ás costas e seguir-me. Cinco coisas, se bem advertimos, faz Christo nas palavras d'este texto; as quaes não sem grande mysterio no dia e solemnidade em que as lemos, são, nem mais nem menos, contadamente cinco: duvida uma, suppõi outra, e aconselha tres. Duvida se haverá quem o queira seguir: Siquis vult post me venire. Suppõi que todos têem sua cruz: Crucem suam. E aconselha que nos neguemos a nós mesmos Abneget semet ipsum: que tomemos nossa cruz ás costas: Tollat crucem suam, e que vamos em seguimento seu : Et sequatur me.

No texto Jesus Christo

duvida uma coisa, suppõe outra e aconselha

tres.

deu S. Fran

cisco.

Que profundamente» entendeu esta divina» philosophia Como o entenaquelle seraphim humano, aquelle vivo crucificado, aquelle cruz e crucifixo de si mesmo, o glorioso Patriarcha S. Francisco! Negou-se a si, tomou a sua cruz ás costas e seguiu de tão perto a Christo, que de muito chegado e unido, appareceu hoje, como uma viva estampa sua, com as cinco chagas abertas. Pasmou o mundo assombrado de tão nunca vista maravilha : pasmou a natureza e pasmou a mesma graça e nós para que possamos tambem pasmar, vamos ponderando clausula por clausula o nosso texto sem sair d'elle.

Os homens não teem vontade

se porque

Prov., 13

II. Siquis vult. Cuidava eu que não havia coisa mais universeria de salvar- sal no mundo que quererem todos salvar-se; mas parece que não querem ir devem de ser mui poucos os que o querem: pois Christo põi em após Christo. duvida se haverá alguem: Siquis vult. O certo é que todos nós nos queremos salvar, mas salvar-nos como queremos: e isto é não querer salvação. Quereis saber se vos quereis salvar? Vêde se fazeis pela salvação o que costumais fazer pelo que muito quereis. E se esta é a verdadeira regra de querer, poucos somos os que verdadeiramente queremos salvar-nos. Queremos e não queremos. Em nenhum entendimento cabe esta contradicção e cabe nas nossas vontades: Vult et non vult piger, diz o Espirito Sancto. O homem perguiçoso e irresoluto quer e não quer. Quer porque quer o fim, vult: não quer, porque não quer applicar os meios, non vult. Assim somos nós queremos e não queremos. Queremos ir ao céu, mas não queremos ir por onde se vai para o céu. No caminho do inferno se vê isto melhor. Ninguem quer ir ao inferno, e ninguem vai ao inferno senão por sua vontade. Por isso Christo não duvida do querer, senão do querer ir após elle: Si quis vult post me venire. O querer e o seguir ha de ser conformemente pela mesma parte: que ir a vontade para uma parte e os passos para outra é não querer seguir. Não vistes os que remam nas galés, como levam os olhos em uma parte e a prôa em outra? Assim somos nós ao remo d'esta vida. Se perguntarmos aos nossos desejos onde teem os olhos? no céu. Se olharmos, para nossas acções onde levam a prôa? no inferno: eis aqui como queremos.

Não foi tal a vontade de

«Ora vêde nas chagas de S. Francisco quão sinceramente S. Francisco. quiz seguir a Christo. Não parece um vivo retrato do Salvador, ou o mesmo Salvador que tornou a viver entre os homens, pobre, desprezado, paciente? que força, que constancia de vontade! quarenta dias pediu no monte Alvernio que alfim obteve que o mesmo Christo em forma de Serafim lhe imprimisse a imagem dolorosa das suas chagas: de sorte que se podia dizer que os homens vendo a Francisco, viam ao mesmo Christo crucificado. Isto, sim, que é querer devéras seguir a Christo!»

O que significa negar-se

a si mesmo.

III. Abneget semetipsum. Se alguem quer ir após mim, diz o Senhor, negue-se a si mesmo. Por ventura que é esta a mais notavel sentença que Christo disse. Que quer dizer que nos neguemos a nós mesmos? Quer dizer que nos hajamos comnosco, como se não foramos nós. Eu que me haja commigo como se não fôra eu: vós que vos hajaes comvosco, como se não foreis vós. Ó que documento tão divino para o bem e para o mal! Se as nossas prosperidades nos vieram como se foram de outrem, que pouco nos haviam de desvanecer! E se as nossas

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