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LI

Já chega a Portugal o mensageiro;
Toda a corte alvoroça a novidade:
Quizera o Rei sublime ser primeiro,
Mas não lho soffre a regia magestade.
Qualquer dos cortezãos aventureiro
Deseja ser com fervida vontade;
por bemaventurado

E só fica

Quem já vem pelo Duque nomeado.

LII

Lá na leal cidade, donde teve
Origem (como he fama) o nome eterno
De Portugal, armar madeiro leve
Manda o que tem o leme do governo.
Apercebem-se os doze em tempo breve
D'armas e roupas de uso mais moderno,
De elmos, cimeiras, letras e primores,
Cavallos e concertos de mil cores.

LIII

Já do seu Rei tomado tem licença
Para partir do Douro celebrado,
Aquelles, que escolhidos por sentença
Foram do Duque Inglez exp'rimentado.
Não ha na companhia differença
De cavalleiro dextro, ou esforçado;
Mas hum só, que Magriço se dizia,
Desta arte falla á forte companhia:

LIV

Fortissimos consocios, eu desejo
Ha muito já de andar terras estranhas,

Por ver mais aguas, que as do Douro e Tejo,
Varias gentes e leis, e varias manhas:
Agora, que apparelho certo vejo,

(Pois que do mundo as cousas são tamanhas) Quero, se me deixais, ir só por terra,

Porque eu serei comvosco em Inglaterra.

Por

LV

E quando caso for, que eu, impedido quem das cousas he ultima linha, Não for convosco ao praso instituido,

Pouca falta vos faz a falta minha.

he devido;

Todos por mi fareis o que
Mas se a verdade o esp❜rito me adivinha,

Rios, montes, fortuna, ou sua inveja,

Não farão, que eu comvosco lá não seja.

LVI

Assi diz: e abraçados os amigos,
E tomada licença, em fim se parte:
Passa Leão, Castella, vendo antigos
Lugares, que ganhara o patrio Marte:
Navarra, co'os altissimos perigos
Do Pyreneo, que Hespanha e Gallia parte:
Vistas em fim de França as cousas grandes,
No grande emporio foi parar de Frandes.

LVII

Ali chegado, ou fosse caso, ou manha,
Sem passar se deteve muitos dias;
Mas dos onze a illustrissima companha,
Cortam do mar do Norte as ondas frias.
Chegados de Inglaterra á costa estranha,
Para Londres já fazem todos vias:
Do Duque são com festa agasalhados,
E das damas servidos e amimados.

LVIII

Chega-se o praso e dia assignalado,
De entrar em campo já co'os doze Inglezes,
Que pelo Rei já tinham segurado:
Armam-se d'elmos, grevas e de 'arnezes:
Já as damas tem por si fulgente e armado,
O Mavorte feroz dos Portuguezes:
Vestem-se ellas de cores e de sedas,
De ouro, e de joias mil, ricas e ledas.

LIX

Mas aquella, a quem fôra em sorte dado
Magriço, que não vinha, com tristeza
Se veste, por não ter quem nomeado
Seja seu cavalleiro nesta empreza:
Bem que os onze apregoam, que acabado
Será o negocio assi na côrte Ingleza,
Que as damas vencedoras se conheçam,
Postoque dous e tres dos seus falleçam.

LX

Já n'hum sublime e publico theatro
Se assenta o Rei Inglez com toda a côrte:
Estavam tres e tres, e quatro e quatro,
Bem como a cada qual coubera em sorte.
Não são vistos do Sol, do Tejo ao Bactro,
De força, esforço e d'animo mais forte,
Outros doze sahir como os Inglezes
No campo contra os onze Portuguezes.

LXI

Mastigam os cavallos, escumando,
Os aureos freos com feroz sembrante:
Estava o Sol nas armas rutilando
Como em crystal, ou rigido diamante:
Mas enxerga-se n'hum e n'outro bando
Partido desigual e dissonante,

Dos onze contra os doze: quando a gente
Começa a alvoroçar-se geralmente.

LXII

Viram todos o rosto aonde havia
A causa principal do reboliço:
Eis entra hum cavalleiro, que trazia
Armas, cavallo, ao bellico serviço:
Ao Rei e ás damas falla, e logo se hia

Para os onze, que este era o grão Magriço:
Abraça os companheiros como amigos,

A

TOM. VI

quem não falta certo nos perigos.

15

LXIII

A dama, como ouvio que este era aquelle
Que vinha a defender seu nome e fama,
Se alegra, e veste ali do animal de Helle,
Que a gente bruta mais que virtude ama.
Já dão signal, e o som da tuba impelle
Os bellicosos animos, que inflamma:
Picam d'esporas, largam redeas logo,
Abaixam lanças, fere a terra fogo.

LXIV

Dos cavallos o estrepito parece,
Que faz que o chão debaixo todo treme:
O coração no peito, que estremece
De quem os olha, se alvoroça e teme:
Qual do cavallo voa, que não dece;
Qual co'o cavallo em terra dando, geme;

Qual vermelhas as armas faz de brancas;
Qual co'os pennachos do elmo açouta as ancas.

LXV

Algum d'ali tomou perpetuo sono,
E fez da vida ao fim breve intervallo:
Correndo algum cavallo vai sem dono,
E n'outra parte o dono sem cavallo:
Cahe a soberba ingleza do seu throno,
Que dous, ou tres já fóra vão do vallo:
que de espada vem fazer batalha,
Mais acham já que arnez, escudo e malha.

Os

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