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bro dêsse ano. A sentença privava-o de voz activa e passiva para sempre (!) e de poder prègar, obrigando-o a reclusão em colégio ou casa da sua religião que lhe fosse designado e a comprometer-se a não tratar das proposições de que fôra arguido. A residência que lhe foi designada, primeiramente, foi a de Pedroso, transferida depois para o noviciado da Cotovia da qual dependia o Hospicio do Santo Borja. O perdão foi concedido em junho de 1668 e, em 15 de agosto do ano seguinte, partia o padre Vieira para Roma, com licença do regente D. Pedro (1).

Foi nessa época, decerto, que êle habitou o casarão onde residiu Castilho.

A casa, descreve-a o sr. visconde de Castilho nas suas Memorias de Castilho. Era uma grande barraca rez do chão com um páteo pequeno e um quintalão enorme. Para a rua tinha só uma janela que era a do escritório do poeta.

É interessantíssima a descrição do edifício. A felicíssima memória do filho do poeta consegue dar-nos uma perfeita ideia de como seria o hospício e o jardim povoado de recordações dos padres e dos alunos do Seminário. O portão de entrada, pintado de verde, dava acesso ao páteo sombreado de duas anágoas de Venus, com uma alpendurada monástica de portaria de convento pobre. A casa de entrada era ladrilhada e tinha e tecto de cúpula donde pendia o lampeão de

(1) Summario de Varia Historia, de Ribeiro Guimarães, volume 4.o, págg. 90-91.

fôlha, oitavado. Alguns bancos antigos encostados ao rodapé de azulejos, constituiam o mobiliário.

O leitor que quiser deliciar-se com a descrição completa do velho hospício, tal como êle se achava em 1843, e do quintalão onde o sublime cego ensinava aos filhos os primeiros rudimentos de botânica, abra o livro 3.o das Memórias e leia o capítulo x. O incómodo é pequeno; o prazer intelectual será grandíssimo.

Pouco resta dizer. Em 1884 foi demolido o barracão e o quintal dividiu-se em talhões para venda.

Quem passa hoje pela travessa de S. Marçal e espreita pelas grades dos jardins do lado do poente, não suspeita sequer que, por aqueles terrenos, agora cuidados por mãos profanas, cruzaram as roupetas severas dos Provinciais da Companhia e passou, efabulando talvez no cérebro privilegiado algum dos seus maravilhosos sermões, a figura austera do eminente, do sublime, do grande António Vieira.

CAPITULO VII

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Suas faça-
A quinta

SUMÁRIO: Pára o autor defronte do edifício da Escola Politécnica e propõe-se a estudar a sua história. A entrada dos jesuitas em Portugal. - Benévolo acolhimento de el-rei D. João III. Primeira residência da Companhia. - A casa de S. Roque. - A palavra persuasiva dos jesuitas. — Nasce a ideia de um Noviciado. Aprova-a o Geral. - Vende-se o colégio velho de Santo Antão. - Dificuldades da Companhia. — Um auxílio inesperado. Fundam o Noviciado Fernão Teles de Meneses e sua mulher. Quem era êste fidalgo. nhas na India. — Lavra-se a primeira escritura. de Campolide. - Principia aí o Noviciado. — Sua inauguração. Embaraços dos jesuitas.-A quinta de Monte-Olivete. - Onde era e qual a razão do seu nome. Antiguidade de tal designação. - Acampa nêste local D. João I de Castela vindo a pôr cerco a Lisboa. —Ferem-se no Monte-Olivete as primeiras escaramuças do cêrco. - O rei D. Duarte hóspede da quinta dêste nome em 1474- Erege-se a Casa de Provação no alto da quinta. É lançada a primeira pedra. Iniciam-se as obras. Morre Fernão Teles. -O arquitecto Baltazar Álvares e o Padre João Delgado. — Vigiam os jesuitas o arquitecto. - Efémera prosperidade das obras. -Principia a faltar o dinheiro.-É socorrida milagrosamente a Companhia de Jesus.

Subida a rua de S. Marçal, onde ficamos no capítulo antecedente, achamo-nos na antiga rua que hoje se chama da Escola Politécnica. Alguns passos mais andados depara-se-nos o edifício majestoso da Escola, construido sôbre os restos do Colégio dos Nobres onde primitivamente fôra a casa do Noviciado dos jesuitas. É desta que vamos tratar.

Foi el-rei D. João, terceiro do nome, que abriu as portas de Portugal à Companhia de Jesus.

Fundara-a, em 1534, Inácio de Loiola, a fim de pôr um dique à reacção que as doutrinas de Lutero iam iniciando entre as nações católicas da Europa, principalmente na Alemanha onde maior número de sectários hasteara o pendão da revolta contra o poder da Igreja.

Obtida, sete anos depois da sua fundação, a célebre bula Tangimini militantis eclesiaes, com que o Papa Paulo III sancionava a sua instituição, reconhecendo ao mesmo tempo a autoridade absoluta e ilimitada do Geral dos jesuitas, constituiu-se a Companhia com a sua sede em Roma e dali começou a bracejar, alargando o seu domínio, fundando institutos, agora em Castela e em Portugal, logo na Alemanha e nos Países Baixos e em breve em todas as nações católicas e nos demais pontos do mundo que os navegadores peninsulares tinham patenteado aos olhos pávidos da Europa.

Dividiu depois êsses domínios em províncias e estas em colégios; distribuiu por categorias, superintendendo nas diferentes divisões, os Visitadores, os Provinciais e os Reitores, êstes obedecendo àqueles que, sujeitos directamente ao governo central, formavam assim um corpo disciplinado e poderoso que por tanto tempo impôs ao mundo a sua vontade e a sua fôrça.

Portugal foi uma dessas Províncias e em nenhum outro país teve a Companhia mais benévolo acolhimento. O rei piedoso foi dos soberanos o que mais privilégios lhe deu e mais amorosamente a recebeu no seio da sua pátria.

Alêm de muitas pensões e benefícios, que a munificência régia largamente lhes dispensou, tiveram os jesuitas casas gratuítas e o que é mais a ampla liberdade de enviar àlêm-mar as suas missões, de fundar os seus colégios e de dirigir o culto e a instrução em todos os seus domínios.

Foi sob êstes risonhos auspícios que, em 1540, os discípulos de Inácio de Loiola se estabeleceram em terra portuguesa.

A sua primeira residência fixa foi no chamado Coleginho, por trás da Moiraria, junto à rua das Tendas, casa esta que fundara a rainha D. Leonor para as freiras da Anunciada.

A casa era acanhada e velhíssima. Ali só residia um ermitão chamado Pedreannes (1). Vencidas depois algumas dificuldades, que Baltazar Teles narra com minúcia, entraram os jesuitas de posse da ermida de S. Roque, em 1563.

Tambêm aí as comodidades não foram muitas. Em humildes choças, em derredor do templosinho, lá se instalaram o melhor que puderam e nêsse estreito espaço começaram a trabalhar, fazendo prédicas amiudadas. E era tal a concorrência que se faziam comummente dois sermões; um dentro da ermida e outro cá fora, no portal, à sombra das oliveiras (2).

Isto refere-nos o cronista da Companhia, dando a nota do aspecto pitoresco do sítio que, naquele tempo, era um arrabalde sombreado e ameno muito frequen

(1) Lisboa Antiga de Júlio de Castilho, volume 1, pág. 51. (2) Chronica da Companhia de Jesus, por Baltazar Teles.

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