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Taes eram as noções dos geografos, dos omens doutos, e dos proprios estadistas francezes acerca da terra avistada por Binot Paulmier de Gonneville, guiados pela tradição, e na auzencia da relação exacta da sua viagem.

§ 4.-Busca do roteiro autentico.

O desvario das concluzões bem demonstrou, que independente de novas informações não era possivel atinar com a realidade do que a tradição vaga apontava.

Do campo das investigações maritimas passou-se ao dominio dos archivos com a pesquiza de documentos, que autenticassem o descobrimento do navegante normando, e indicasse o ponto certo do seu descobrimento.

Na memoria do bisneto de Essomeric existia um extrato da relação da viagem do capitão seu antepassado; e essa relação deveria conter as noções precizas para o esclarecimento da verdade.

O navio Espoir, pois assim xamava-se a embarcação, que executára essa aventuroza viagem, ao xegar ás costas da Normandia em França, fôra salteado por piratas, e vio-se forçado a encalhar nas praias da ilha de Jersei. Os naufragos entráram em Onfleur, e em observancia das leis maritimas francezas, que obrigavam os navegantes de longo curso a depozitar no almirantado os seus diarios nauticos, o capitão Binot Paulmier e seus companheiros de naufragio redigiram uma relação da sua viagem, e a depozitaram no conselho do almirantado de Rouen, para suprir os diarios de bordo perdidos com o navio.

Não se duvidava pois, que nos archivos publicos existisse similhante documento. As pesquizas porém, antigas e modernas, tinham sido infrutiferas; e tamsomente subzistiam a tradição e as informações do conego, que não deixavam sahir das duvidas e incertezas.

Foi n'estas circunstancias, que em 1869 apareceu o documento dezejado, isto é, a relação autentica da viagem feita no navio Espoir pelo capitão Binot Paulmier de Gonneville, sahido de França em 1503.

Este documento pôz fóra de questão a viagem, e ministrou elementos para conhecimento da decantada terra austral, tão baldadamente procurada.

Como foi tal documento descoberto, o veremos da seguinte carta escrita pelo bibliotecario da biblioteca do arsenal em Paris a Armando d'Avezac, membro do Instituto de França, em data de 12 de Janeiro de 1869.

Carta ao Sr. Armando d'Avezac, membro do Instituto.

Biblioteca do Arsenal 12 de Janeiro de 1869.

Caro Senhor.-Com verdadeiro prazer vos envio o trexo de um pequeno manuscrito, que me parece desconhecido, ao menos em parte, e que copiei para vosso uzo, pois trata-se de uma antiga viagem de descobrimentos atribuida a um navegante francez, Binot Paulmier de Gonneville, de que vos ocupastes em douto relatorio dirigido á sociedade de geografia, em 1857.

Este manuscrito, composto de 12 folhas de escritura. que podemos fazer xegar aos primeiros annos do 18." seculo, foi axado entre os papeis do marquez de Paulmi, que sem duvida intentara servir-se d'elle nas suas Memerias tiradas de uma grande biblioteca.

Creio, que quazi metade d'este manuscrito ainds está inedito.

O conego João Paulmier, bisneto do indio Essomeric, adotado por Binot de Gonneville, e trazido para França regresso da viagem, que este navegante fizera aos mares austraes, publicou sómente algumas paginas da relaçã) original, na obra rara e curioza, que editou em 1663.

Mando-vos cópia de tudo quanto não foi publicad pelo conego João Paulmier. Essa garatuja ao correr d pena vos provará, que empenhei-me em servir aos vosses doutos trabalhos geograficos, eu, profano, mas simpatico.

O prezidente Carlos de Brosses nos diz, que o conde de Maurepas, ministro da marinha, mandou fazer pesquiza

nos cartorios dos tribunaes do almirantado na Normandia, para descobrir o original da relação, que o capitão Binot de Gonneville devia ter ali depozitado, conforme o testimunho do conego de Lisieux; mas não o poderam axar.

Agora tendes em vista a peça completa, que foi aprezentada no. 10.° seculo, e registada em acto autentico do mez de Agosto de 1658.

A vós, istoriador dos nossos antigos navegantes, compete dizer definitivamente o que devemos pensar do capitão Binot Paulmier de Gonneville e da sua viagem de 1503.

Aceitae a segurança da minha afetuoza dedicação.

Paulo Lacroix.

5.-Veracidade do documento e fórma de sua
publicação.

O documento agora descoberto consiste em uma certidão da relação da viagem do navio Espoir, passada por autoridade publica e com solenidade judicial; não póde pois ser recuzada a sua veracidade.

Descoberto elle, foi entregue ao eximio geografo Armando d'Avezac, como se vê da carta retro,o qual, tratando do preciozo axado, diz o seguinte: «O manuscrito, que possuimos, é cópia extrahida de uma certidão legal, entregue aos erdeiros de Binot Paulmier a 20 de Agosto de 1658, conforme a minuta conservada no archivo do conselho geral do almirantado de Rouen em data de 19 de Junho de 1505. »

De posse do manuscrito tratou o ilustre geograf francez de publical-o; e porque a contestura compacta da sua redação seria um motivo de obscuridade e fastio para o leitor, rezolveo o sabio publicador do manuscrito darThe fórma mais amena e agradavel, explicando assim a sua fórma de publicação:

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<< O documento principal, religiozamente conservado

P. 11 VOL. XLIX

em sua redação antiquada e no estilo de cartorio, sómente foi despojado do aspecto bronco e penozo, que lhe dava a compacta sequencia do testo oficial; para isso bastou simples artificio e dispozição tipografica para darlhe acésso mais agradavel e mais graciozo seguimento. > A publicação pois fez-se mediante a divizão do testo em titulos e paragrafos com os respectivos disticos da materia n'elles conteúda, como se verá na tradução, que adiante oferecemos.

O douto escritor francez publicou o documento nos Annaes das viagens (Annales des voyages) no anno de 1869, precedido de um prefacio em que discutio o mesmo documento, e as questões a elle atinentes, e do qual deduzimos as nossas considerações.

A publicação fez se com este titulo: « Relation authentique du voyage du capitaine de Gonneville ès nouvelles terres des Indes publiée intégralement pour la primière fois avec une introduction et des éclaircissements.>>

§ 6.-Navegação do capitão francez.

O aparecimento da relação autentica da viagem do navio Espoir, pondo fóra de duvidas o facto do descobrimento da terra austral tantas vezes buscada, subministrou indicações bastantes para o conhecimento e determinação de qual fosse ella.

O ilustre geografo, a quem foi confiado o manuscrito pelo inventor, expoz todas essas indicações e analizou-as, rezultando da sua analize o esclarecimento dos pontos obscuros da narração conservada na tradição, a marxa de toda a viagem, e o reconhecimento dos sitios, onde tocou o navio explorador.

Assim ficou patente, que o navio francez efetivamente veio ao Brazil, aqui esteve, e daqui regressou á França. Todo o exame das provas rezumiremos nas seguintes concluzões, que restauram a perigrinação dos navegadores normandos:

1.° Que a 24 de Junho de 1503 o capitão Binot Paulmier de Gonneville sahio do porto de Onfleur no navio

denominado Espoir com destino ás Indias orientaes para especular em especiarias;

2.° Que esse navio, costeando a Africa com o fim de dobrar o cabo da Bôa-Esperança, depois de transpôr a linha equinocial, foi desviado do seu rumo por uma tempestade, e a 5 de Janeiro de 1504 avistou terra em situação desconhecida;

3.° Que essa terra é o Brazil, sendo o logar, onde xegaram os navegantes, um ponto da costa da nossa atual provincia de Santa-Catarina;

4.° Que esse ponto, a que o navio aportou, e onde os navegantes dezembarcáram a 6 de Janeiro de 1504, é a foz do rio de São-Francisco do Sul; *

5.° Que ahi se demoráram os navegantes francezes até 3 de Julho seguinte, partindo n'esse dia para França;

6.° Que em regresso, depois de 90 dias de navegação, tocaram em um ponto da costa, onde, sahindo gente do navio em terra, foram mortas tres pessoas da tripolação por indios bravios;

7.° Que, dahi partindo, foi ainda o navio aportar em outro ponto da costa brazilica, na provincia da Bahia; 8. Que, depois de alguma demora n'esse ponto, para o navio completar o seu carregamento de generos do paiz, partio e foi a 5 de Janeiro de 1505 avistar a ilha de Fernando;

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9. Que dahi encaminhou-se para França, em cujas costas foi acommetido por piratas, e vio-se forçado a encalhar nas praias da ilha de Jersei, donde a tripolação com o seu capitão á frente recolheu-se a Onfleur no dia 20 de Maio de 1505.

Tal foi a navegação e o exito da viagem do capitão Binot Paulmier de Gonneville no nato francez Espoir.

Eis como se exprime ✰rmando d'Avezac em sua analize da relação autentica :

<< Como a terra, onde aportáram, era ao sul do tropico,e ahi vegáram ao cahir das calmarias, torna-se evidente, que o surgidouro devêra ser na costa do Brazil entre as latitudes de 24.° por um lado, e de 27.o a 30. por outro.

<< Ora, na latitude média entre os dous termos, aos 26.°10' sul dezembóca ó rio de São-Francisco do sul, no paiz abitado pelos Carijós.

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