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de 10 de Fevereiro do mesmo anno, fazendo-se embarcar alli na Bahia o bondozo conde da Palma que governava a provincia.

Fez-se nova reunião na insistencia de verificar-se a revolucção pretendida; e os pareceres eram tão discordes sobre o chefe a nomear, que eu e meu amigo Manoel Clemente, nos levantamos e dissemos-se nos acreditão offereçemo-nos para realisar o projecto, e botarmos para fóra da provincia o general Luiz do Rego officialidade e tropa de Portugal. Depois de alguns argumentos de indignação por ter eu dito que tanto fariamos se nos promettessem não mandar a Luiz do Rego auxilio algum-consentiram. Visto correr algum risco; sendo com tudo certo que a Bahia mandou a Luiz do Rego o auxilio de 300 homens armados, viveres, e munições de guerra em uma fragata. Acceitou o nosso offerecimento d'alli partimos para Pernambuco em fins de Maio.

Em principio de Junho seguinte, chegamos aqui; e lembrados do máo exito que tiveram os dous enviados da Bahia anteriores, mandamos vir cavallos e partimos nesse mesmo dia para o interior da provincia; indo hospedar-nos no Engenho Cangahú do sargento-mór Joaquim Martins da Cunha Souto Maior, mui distincto cavalheiro e eximio patriota. Ahi longe da visinhança da cidade do Recife, do general Luiz do Rego, e das atmospheras de seus espiões e aduladores; começamos o estudo das circumstancias em que se achava o paiz e das pessoas que era preciso concorressem para o bom exito do nosso plano.

Neste estudo levamos dous mezes pouco mais ou menes, e desse retiro nos servimos para preparar meios e pessoas, que nas occasiões proximas nos servissem, e dispozessem os animos dos povos sem com tudo nos arriscarmos a fazer crer que queriamos fomentar uma revolução. Neste trabalho que, foi um dos mais arriscados, tivemos a satisfação de encontrar auxiliares os mais dedicados e prestimosos. As nossas cautellas eram tamanhas que os nossos maiores amigos ignoravam as nossas intenções; — nem o mesmo Sr. de Engenho ácima nomeado, que nos alojára, nem esse mesmo soube o fim que nos propunhamos, senão no dia em que rebentou a revolução. Era-nos necessarios

conhecer a fundo o espirito de nossos amigos da Parahyba e do resto da população, porque sendo alli o governador o coronel Rozado, com um bonito batalhão, commandado por officiaes de Portugal, era natural que quadjuvasse o general Luiz do Rego, tornando assim duplicado o nosso trabalho, e muito mais arriscado. Montamos a cavallo e fomos á Parahyba; sómente alli nos demoramos tres dias nos quaes visitamos todos os nossos amigos, e companheiros que tinham sahido da prisão da Bahia. Todos foram bem apalpados, e todos bem insinuados para predispôrem os inferiores do batalhão; não só para não se oppôrem a qualquer movimento de Pernambuco (que por acaso, nas circumstancias vexatorias em que o paiz se achava houvesse de apparecer; como negarem-se a qualquer marcha para aqui.

Tivemos sempre a cautella de nunca apresentar-nos, como iniciadores do arrojo pretendido e tornámos para o Engenho Cangahú. Temendo demorar muito o nosso intento, e não sabendo ainda se podiamos contar com o animo dos officiaes inferiores do batalhão da Parahyba; nem podendo confiar em correspondencia por escripto, volvemos á Parahyba. Então assentámos necessario communicar aos nossos amigos que havia um plano de revolução; porém que os principaes auctores faziam guardar um segredo indispensavel para o bom exito, tendo exigido juramento para isso. Certos de que quasi a totalidade dos inferiores, houvesse o que houvesse de futuro contra os seus patricios, nunca entregariam as armas: sahimos satisfeitos; e julgando indispensavel ouvir os animos do interior da provincia, chegamos até a villa do Pilar, onde encontramos decidida resolução em todo o caso patriotica: tornamos para Cangahú, onde era necessario combinar os meios do rompimento.

Entre as pessoas que nos visitaram em Cangahú foi uma dellas-o tenente-coronel Manoel Ignacio Bezerra de Mello, que então se achava commandando uma brigada em Nazareth da Matta, moço valente, muito patriota e liberal; dispertamos-lhe os brios, e da nossa conversação concluimos que era apto para a iniciação da nossa tarefa ; sem comtudo o convidarmos para cousa alguma. O mesmo

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aconteceu na segunda visita que nos fez, em que lhe promettemos ir passar o domingo proximo em sua casa, no Engenho Tamataúpe de Flores, quasi contiguo á cidade, hoje de Nazareth, e então villa, onde se faziam as revistas de milicias todos os domingos.

Imaginamos um motivo que désse lugar a reunião da tropa armada e municiada, e em estado de marchar. Fizemos espalhar que nas proximidades dos Mocós, um bando de ladrões assaltaram um grande comboio do sertão, e roubára matando os conductores; e isto quatro dias antes da visita promettida. Preparada toda a correspondencia ou participação as auctoridades, e aos vigarios da provincia, a excepção daquelles da cidade do Recife, no dia aprasado, conduzimos essa papelada, e nos apresentamos em casa do tenente-coronel Manoel Ignacio Bezerra de Mello; alli conversamos até horas de jantar, findo o qual chamamos para um quarto separado dito tenente-coronel, mostramos-lhe um manifesto em que expunhamos o estado violento em que o general Luiz do Rego havia posto a população da provincia; as circumstancias da quadra politica em relação ás outras provincias; e mesmo em relação aos negocios de outros povos da America. A necessidade de irmanarmos os nossos interesses e aspirações á forma do governo-á então metropole da nação-que tão cobardemente era trahida pelo general Luiz do Rego, obrigando-nos que antes de mais desgraças a oppôrmos um paradeiro, fazendo sahir da provincia o general Luiz do Rego, toda a officielidade de Portugal e sua soldadesca: pois seria vergonhoso que os Pernambucanos que não se acobardaram as hostes aguerridas da Hollanda trepidassem em sacudir o jugo tão vergonhoso que actualmente soffrem. Assim devemos approveitar o ensejo; marchar com essa tropa aqui reunida para Goianna; reunir a maior somma de forças da provincia, e começarmos pela eleição de um governo preparatorio para satisfazer as ordens emanadas de El-Rey D. João VI na forma estabelecida no decreto a respeito.

Tudo o tenente-coronel Manoel Ignacio approvou contentissimo; convocou a officialidade da tropa á sua casa, e todos concordaram na resolução communicada. Chama

ram-se estafetas e destribuiram-se as communicações; não só aquellas de que já se tratou, como as necessarias para a marcha immediata dos batalhões de melicias para a villa de Goianna. Montamos depois a cavallo e dirigimo-nos para a villa do Nazareth, onde se achava a tropa da brigada daquelle tenente-coronel.

Alli, cu a frente da tropa li o manifesto seguinte ;— Pernambucanos, chegou hoje o termo da nossa paciencia e soffrimento. Tem-se zombado da melhor e mais numerosa parte da monarchia portugueza, e suppondo-nos méros instrumentes de suas vontades arriscam-se a tentar agrilhoar-nos ao seu carro carcomido! O genio da Nação erguendo-se do longo pezadello que o tinha entorpecido, brada as armas portuguezas de ambos os hymispherios, vamos soltar a liberdade que os aulicos e bastardos filhos da Nação pretenderam anniquillar para sempre; restituámos a patria seus dias gloriosos, e lançemos de entre nós esses miseraveis discolos, esses hypocritas nogentos que bajulando a realesa cavam-lhe o descredito, murcham-lhe as boas intenções e levão a Nação á extrema miseria e desconsideração. No desespero de ver o mal velho esvairse e refolgar a prosperidade da Nação quizeram-lhe oppôr o mais louco expediente, e assim fizeram occupar as prinvincias do Brasil por tropas da mãe patria, não mandadas pela nova ordem de cousas, mas tão sómente combinadas pelos estadistas da velha politica. A este arrojo acodio o general Luiz do Rego, e logo offereceu a El-Rey 12:000 homens pernambucanos armados disciplinados e commandados por officiaes portuguezes: assim ficou o chamado cordão-Sanitario estabelecido. Soldados, valentes defensores da patria! A nenhuns outros está reservada a gloria de cortar o fragil nó gordio da pucilanima dessa gente ignobil. Ainda em Pernambuco não cessaram as lagrimas de tantas victimas sacrificadas por Luiz do Rego e seus satélites; ainda goteja o sangue do padre Antonio Pereira, do valente militar Domingos Theotonio, e dos illustres Martyres da patria, nessa maldita época de 1817. Vinguemos pois com o exterminio destes algozes, tantos males recebidos, ultrages e depredações. O santo genio de Pernambuco marcha em nossa frente para nos livrar dos car

rascos, e alentar as nossas provincias Irmãs á debellar nossos inimigos communs. Avante soldados Pernambucanos, o mundo nos observa: marchemos entoando o sagrado nome da patria dos bravos - Menna e Manoel Clemente Cavalcante de Albuquerque.

Finda a leitura apresentei as considerações precisas afim de electrisar a tropa e animal-a; e com o numero de seiscentos e tantos homens fuzileiros e de cavallaria encetámos a marcha para Goianna. Eram 5 horas da tarde, o tempo estava carregado, e logo começou a chuva a cahir que continuou até, as quatro da madrugada, quando chegámos ás proximidades de Goianna. Ahi passou-se revista acharam-se menos de duzentos homens. Convocaram-se os officiaes a conselho maior porque parecia d'ahi por diante qualquer operação atrevida e arriscada; e por isso o conselho de maior numero de individuos foi que cada um seguisse para suas casas, destroçando esse pequeno corpo de soldados eu e o meu companheiro e amigo Manoel Clemente, increpamos de fraqueza um tal conselho; e uma vez que nós tinhamos começado divíamos ir para diante; ou tivessemos de ser batidos, ou de triumphar.

Ainda se suscitaram muitos receios aliás judiciosos, por quanto o estado em que nos achavamos não proporcionava especie alguma de estrategia; pois Goianna possuia dous batalhão completos de fuzileiros, um dito de artilheria, dito da praia e um esquadrão de cavallaria,tudo completo. Não obstante cederam ás nossas idéas, e foi nomeada uma commissão para levarmos á Goianna as nossas intenções - foi Manoel Clemente Cavalcante de Albuquerque, o tenente-coronel José Maria de Mello e eu; ordenamos que fossem mettidos em linha em roda de Goianna todos os individuos que sahissem, ou tivessem de entrar em Goianna entremeiando-os de espaço em espaço com soldados; e assim vista de Goianna parecia centuplicada a nossa força.

Montamos a cavallo e nos dirigimos á villa, onde chegámos ás 8 horas do dia, e tocámos fortemente á rebate no sino da cadeia. Acudio o carcereiro e os mais empregados do edificio, e mandamos congregar a camara Muni

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