«Podem-se pôr em longo esquecimento As cruezas mortaes, que a Lysia vio, D'esse Telles Jordão, e do cruento Bastos, quando o Miguel nos dirigio. Por isso o Cabralão, que o sentimento De não ser rico ao mundo descobrio, Faz rebentar no Porto a escarapela, Dizendo ser Maria a causa d'ella.
<<Maria era a senhora, que casada Está com quem no brio a ninguem cede, Por virtuosa mãe considerada,
só a ventura dos seus pede. Com esta voz a invicta alevantada, Lembrando que esta filha o pai succede, Suas forças ajunta para as guerras, Que tiveram lugar nas lusas terras.
«Vem de toda a provincia ao fresco amigo, Que tanta supisota ha praticado,
Juntar-se muito pulha, muito imigo Da rainha e da carta declarado; Mas elle sem temer nenhum perigo, Só para conseguir seu fim damnado, De irmão o nome dá a toda a gente, Que depois a Satan deu de presente.
«Os chabancas na antigua valentia Ainda confiados, se ajuntavam Da cabeça de toda a terra fria Que do soberbo Douro as aguas lavam. Tambem Braga fiel se apercebia, Que antigamente os Burros habitavam, Trazendo por insignias verdadeiras, Dous cacetes pintados nas bandeiras.
«Tambem vem lá da terra do Macedo, Cidade muito antigua, a quem cercando O Minho em torno vai suave e ledo, Que das terras dos Chancas vem manando. A vós outros tambem não tolhe o medo, Ó sordidos gallegos, rudo bando,
Que para resistirdes vos armastes, Aos taes de quem biscoitos já provastes.
«Tambem movem da guerra as negras furias A gente da Beirinha, que carece
De polidas rasões, e que as injurias Muito mal dos estranhos compadece. A terra da gentinha das lamurias, Que com a grosseria se ennobrece, Armou d'ella os cachorros moradores Para ajudar na guerra os estupores.
«Cabral a quem de caco o amor lhe crece, Como a Samsão Hebreo da guedelha, Posto que tudo pouco lhe parece,
Co'os chimbeus candongueiros se apparelha: E não porque destreza lhe fallece Co'os principaes verdugos se aconselha; Mas só por ver das bestas as sentenças, Que sempre houve entre muitas differenças.
«Não falta com razões quem desconcerte Da opinião de todos, na vontade, Em que a maldade antiga se converte Em desusada, mas fidelidade, Podendo o medo mais, gelado, inerte, Que a propria e natural deslealdade: Dão vivas ao progresso; e se convem, Ao demo que os carregue os dão tambem.
«Mas nunca foi que este erro se sentisse N'um certo Cortabolsas diro: antes, Posto que em muitos outros claro o visse, Reprovando as vontades inconstantes, Áquelles grandes farroupilhas disse, Com palavras mais duras que elegantes, A mão na durindana, irado e fulo, Ameaçando a terra em modo chulo:
«Como da gente Lusa Portugueza
Ha-de haver quem não preze o patrio Marte? Como d'estas terrinhas, que tão teza
A gente se ha mostrado em toda a parte, Ha-de sair quem negue ter defeza, Quem negue a fé, o amor, o esforço e arte De Cabralista, e por nenhum respeito O véro Sauro queira ver sujeito?
«Como? Não sois os mesmos ou parentes D'aquelles, que debaixo da bandeira
Do Libertador, feros e valentes Deram cabo da gente caceteira ? Quando tantas bandeiras, tantas gentes Fizeram dar ás gambias, de maneira Que muitissimos burros lhe trouxeram Prezos, fóra a pechincha que tiveram ?
«Com quem foram contino sopeados Estes de quem o estaes agora vós, Por homens altamente sublimados, Senão c'os vossos fortes paes e avós? Pois se com seus descuidos, ou peccados O Ciniphe em fraqueza tal vos poz, Torne-vos vossas forças o Pai novo: Se é certo que co'o Pai se muda o poyo.
«Pai tendes tal, que se o valor tiverdes Igual ao Pai que agora alevantastes, Amachuca reis tudo o que quizerdes, Quanto mais a quem já amachucastes: E se com isto emfim vos não moverdes D'esse grande cagaço que tomastes, Atai as mãos, bonecos de sabugo, Que eu só resistirei ao feio jugo.
«Eu só co'os meus amigos e com esta, (Apresenta uma bolsa recheada) Defenderei da força dura e infesta, A terra não de todo depennada: Em virtude do Pai, da patria mesta, Da lealdade já por vós negada, Vencerei, não só estes adversarios, Mas quantos a meu Pai forem contrarios.
«Bem como entre os donzeis appetecidos Lá no Rocio, heroes de paus e canas, Já para se entregar, quasi movidos, A toda a casta suja de parranas, Macedo tolo os faz, que compellidos Da bengalinha jurem, que os Bananas Ricos não deixarão, em quanto vida Tiverem, e a belleza não perdida :
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