Nunca o Tanas tão pobre se mostrou De expedientes como tinha d'antes; Das artimanhas com que se illustrou Entre a corja dos outros traficantes. Nem tanto o grão Tunante arremessou Pitadas pelas ventas fumegantes,
Na enorme queda d'onde sós puderam Salvar-se dois que menos pulhas eram.
Quantas esperanças fatuas se tingaram Com as pastas tão queridas e adoradas! Quantas noivas as flores desfolharam De laranjeira ha pouco inda compradas! Quantos contribuintes se alegraram Livres d'essas harpias maldiçoadas! Mas vão-se emfim, e do poleiro descem. Melhor fôra que nunca cá viessem!
Vendo o manhoso aldrubio que tão perto Do fim do seu desejo se perdia, Que se lhe fôra o ganhosinho certo Com que aladroadamente a bolsa enchia; Confuso de temor, da vida incerto, Onde nenhum remedio lhe valia, Corre a casa do Chefe de má morte E em voz de sovelão diz d'esta sorte:
«Amigo Zé, que tanto pão me déste A ganhar, e jámais puzeste peias A quem do alheio se regala e veste; Protector de famintas alcatéas; Tu, que em Povoa e Meadas obtiveste Que de ti se dissessem cousas feias, E ajudaste as proezas do Raymundo E as partidas que fez por esse mundo;
«Se pelos meus recursos ardilosos Fiz entrar tanta chelpa nos mercados, E mitigar a sêde aos sequiosos
Com os dinheiros de Londres importados; No fim de expedientes tão rendosos Não nos deixes de ti desamparados;
Se o estar comnosco em cima não te offende, Outra vez lá nos põe, que a cousa rende.
«Oh ditosos aquelles que puderam Encher o papo em terras africanas, E que os mares e febres não temeram Para lá irem explorar esses bananas! Mas mais ditosos os que cá souberam As manhas praticar dos sabios Tanas; Que a vida, é mais prudente aqui vivel-a Por onde anda a raposa e os filhos d'ella.»
Assim dizendo, o ouvido arrepiavam Os sons esganiçados que ia dando; As unhas mais e mais lhe negrejavam
Com que outr'ora os guinéos fôra empolgando. Protestos e promessas não faltavam Com que o chefe se estava recreando; O seu desejo é ver se a pasta aferra Para fazer novo emprestimo em Inglaterra. LXXXV
Mas o finorio rolha moderava A furia insana com serena fronte, E com mansas palavras lhe falava Sorvendo umas pitadas de simonte. As causas e motivos lhe apontava Da mudança, e declara-lhe que conté Que, se algum dia a sorte se lhe vira, Elle d'aquelle estado o livra e tira.
«Estas obras do Fontes são por certo, Disse; mas esperemos, porque em breve O caminho nos ha de ser aberto Que ao poder outra vez nos guie e leve.»> Isto dizendo, como girio experto, Sacudiu o peitilho, alvo de neve, E com maneiras muito affectuosas Despede o outro, e foi regar as rosas.
D'ahi a pouco os regeneradores, Em quem o alto rei tanto se fia, Do governo tornavam-se senhores Por astucia que a todos illudia. Conservar determinam por amores O poder que de novo lhes volvia, Fazendo entrar as seducções das bellas Como arma nas politicas querelas.
Assim foi; porque cedo não largaram As pastas que nas mãos se lhe adormecem. Novas tricas e manhas inventaram Com que do erario as arcas emmagrecem. A penitenciaria edificaram,
Onde muitos á farta se enriquecem, E que, quando ninguem no mundo a queria, Como alto invento aqui se introduzia.
Foi de certo excellente e grande meio Para saciar a turba rapinante,
Que, por ser cousa feita com asseio, Talvez não venha a ter um habitante. E é justo; que, pois deu, segundo creio, O que tinha que dar, d'aqui em deante É deixal-a cahir, e que a concerte Quem com obras inuteis se diverte.
Esta sapientissima assembléa
Muitas que taes façanhas obrar sabe; N'ellas todos os dias se recreia
Para que mais depressa o bago acabe. Não sabe a sucia tanto bem se o creia, Que o dinheiro nos bolsos lhe não cabe; E contente tambem é quem os manda, Que pela Europa em viajatas anda.
D'esta maneira os cofres se exgottavam Por contentes trazer estes senhores; Rios de ouro por Tancos se espalhavam Para abafar das tropas os clamores. Assim os bons costumes se estragavam E cahiam em odio os corruptores, Que, tendo enchido a pança á frandulagem, Viram-se ao fim sem teca para a viagem.
Já está o juizo a arder d'estes parceiros, E a ninguem lembra uma medida boa, Quando do mais matreiro dos matreiros A voz no coio retumbando soa.
O que milhões sumiu nos Extrangeiros Nova mina julgou ver pela proa ;
Disse então mestre Antonio Circassiano: «Dei no vinte, ganhei, se não me engano.
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