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vieram a cidade João Vicencio San Felice e o tenente de mestre de campo Diogo Ruiz.

O trajecto fez-se de noite e foram elles obrigados a subir e descer muitas escadas, provavelmente para lhes fazer crer que eram grandes as fortificações.

Foram os parlamentarios dos sitiantes levados á casa de Quiff onde estavam reunidos os membros do conselho secreto, os capitães da infanteria e os dos navios e sete negociantes que tinham voto.

Declarou San Felice que vinha pedir ao coronel que articulasse as condições da resolução que pedira ao general da Hespanha, para que este respondesse a ellas, como achasse conveniente, tendo duas horas para levar a resposta. Pediram os hollandezes dois dias para dal-a, mas annuindo os hespanhoes em esperar até a manhã seguinte, concordaram com isto.

Pela manhã poude Diogo Ruiz sahir pela cidade a informar-se e o resultado das conferencias foi a capitulação de 29 de Abril.

Entregaram a cidade que tinha de guarnição 1919 homens, incluindo os officiaes, tudo gente de infanteria boa e moça, mas sem homogeneidade nem disciplina, pois eram inglezes, francezes, hollandezes e polacos.

Foram condições da capitulação assignada pelos conselheiros Guilhelmo Stop, Hugo Antonio e Francisco Duchs:

Deixarem toda a artilheria, armas, bandeiras, bastimentos, munições, navios, dinheiro, escravos, fazendas que fossem encontradas, assim como os pri sioneiros, obrigando-se os cercados a entregar na mesma noite uma das portas e não combaterem contra a Hespanha até chegarem á Hollanda.

O governador, cabos, ministros e officiaes deviam sahir com suas espadas e roupa, sendo verificado pelas pessoas para isso indicadas que não levassem mais do que lhes era permittido; que lhes seriam dados navios para voltar á Hollanda, com os mantimentos precisos para tres mezes de viagem, armas para defesa, os meios precisos para a navegação e salvo conducto para não serem obstados por navios hespanhoes, se os encontrassem.

Achavam-se na praça alguns moradores, 600 negros, 18 bandeiras, 270 peças, muitas outras armas e munições, 6 navios, pouco dinheiro, algum marfim e assucar e 7.701 marcos em prata.

D. Alvaro de Abranches foi nomeado para tomar conta da guarda da porta, que foi entregue logo no ultimo de Abril, e em 1. de Maio D. João de Orellana entrou na cidade.

Üs soldados começaram a saquear, como se fossem inimigos e deu-se um alvoroço junto ás portas, no qual foi morto o proprio tambor que fóra levar ao Carmo o primeiro documento para a capitulação.

D. Fadrique fez conhecer um bando severo, prohibindo o saque e eviton com isto desastre maior, porque os soldados que foram enviados no principio da confusão, para prender os saqueadores, roubaram tambem.

O auditor D. Jeronymo Quesada de Salorzano percorreu as ruas com uma forte escolta escolhida e, de accordo com as ordens do bando, foram enforcados summariamente diversos soldados encontrados saqueando.

Cinco moradores christãos novos foram tambem enforcados, assim como alguns indios, sendo premiados os Tabajaras que haviam tomado partido pelos portuguezes, durante a guerra.

D. Henrique de Alagon foi enviado á Hespanha para dar parte ao rei de se achar a cidade rendida.

Foi um dia de abundantes chuvas este 1." de Maio de 1625 e grande se tornou a confusão no meio da tropa, que entrava avida de saque e dos hollandezes que sahiam com o que tinham, para embarcar.

Havia, entretanto, se preparado em Hollanda uma esquadra de soccorro, a qual largou da Europa em fracções.

A 1.o de Janeiro sahiram de Dort duas náos para Plymouth, onde já estavam 18 navios, os quaes juntaram-se no Canal a 14 outros, formando ao todo 34 vasos.

Sete ainda ficaram.

O commandante da esquadra Baldwin Hendrikzoon soube, por um navioinglez, que a grande frota de Hespanha tinha largado de Cadiz a 14 de Janeiro.

D. Fadrique tambem soube da vinda da esquadra, por aviso que lhe mandou de Tenerife D. Garcia de Avila Munhoz, qu ehavia recebido noticia da expedição hollandeza por pescadores de Tenerife, que haviam visto a esquadra no mar navegando para o sul.

Os hespanhoes apanharam tambem um patacho muito veleiro que Baldwin mandara de Cabo Verde para a Bahia, participando a chegada proxima do

soccorro.

Reuniu-se conselho na Bahia, no qual foi resolvido que a gente hollandeza que estava na praia esperando embarque, fosse mettida em navios desarvorados que ficariam debaixo da artilheria dos fortes da cidade e que se esperasse a esquadra hollandeza na barra.

A 22 de Maio appareceu a esquadra hollandeza, ficando nesse dia á distancia de 4 legoas no mar e no dia seguinte approximou-se da barra, em dias filas, com a almiranta na frente e a vice-almiranta na rectaguarda.

Alguns navios da armada hespanhola foram se estendendo de través, de noroeste, a sueste, pondo-se a barlavento do cabo Santo Antonio.

A esquadra hollandeza foi chegando, de modo a parecer que pretendia forçar a entrada, mas virou depois para o lado da ilha de Itaparica, fazendo proa para o mar e foi-se.

A almiranta hespanhola esteve a ponto de se perder no perigoso banco de Santo Antonio e a armada não perseguiu a esquadra hollandeza, como era de presumir.

A volta da esquadra portugueza e hespanhola para a Europa foi assignalada por muitos desastres e naufragios.

NOTA-15

Sobre os actos de D. Fadrique, como autoridade aqui na Bahia, será de interesse para o leitor conhecer alguns:

O que se refere ao castigo dos habitantes que se haviam submettido ao jugo dos hollandezes, já foi publicado e ahi vae em outra nota.

A presente mostra a resolução do general sobre o presidio que deixou de guarnição na cidade e a nomeação de um dos Officiaes que devia ficar no commando de uma das companhias do citado presidio.

Dom Fadrique de Toledo Osorio, marquez de Villa Nova de Valduesa, Capitão General d'Armada e exercito do mar Oceano e do Reino de Portugal, etc.

Porquanto está resoluto que convem pera segurança e defensa desta Cidade do Salvador, que possuia o Olandez rebelde, de quem a recuperou, ficarem nella de prezidio mil soldados Portuguezes repartidos em dez companhias, a que se nomearão Capitaens per haver entregue sem elles o Senhor D. Manoel de Menezes, General da Armada de Portugal os novecentos homens que se lhe pedirão, sendo primeiro advertido que se receberião as companhias inteiras, por escuzar a nova nomeação que se fez: mando ao Provedor mór da Fazenda de Sua Majestade desta cidade que ora serve o dito officio e adeante o servir,, e aos mais officiaes da Fazenda Real, seos superiores, ou inferiores, a quem a execução desta minha ordem possa pertencer, que fação lista das ditas dez companhias e do sargento-mór Pedro Correa da Gama, Governador dellas, restando-lhes seus soldados pela forma que se uza nos mais presidios da Coroa de Portugal e se lhes paguem seus soldos, assy e da maneira que se costuma fazer nas mais partes deste Estado, e pera lhes constar do conteúdo registrarão a prezente no Livro de seos Officios e a Provisão que S. Magestade me deo para dispor o que entendesse que convinha a seo serviço nesta occasião, em cuja virtude e uzando dos poderes que nella me dá, mando aos sobreditos officiaes cumprão e guardem esta minha ordem, como se nella contem, sem contradição algua, com pena de perdimento de seos officios e das mais que merecerem. Dada na Cidade do Salvador, Bahia de todos os Santos, aos vinte e dois de Junho de mil e seiscentos e vinte e cinco. Dom Fadrique de Toledo Osorio, por mandado de Sua Excellencia. Dom José de Sarabia. Concertei este

VOL. II

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Registo com a propria Provisão que registei aqui por mandado do Provedor-mór. Gonçalo Pinto de Freitas.

(Vol. 2." das Provisões Reaes.-Bibl. Nac. Patente do Capitão Simão Leite do Amaral,

Dom Fadrique de Toledo Ozorio, Marquez de Villa Nova de Valduesa, Capitão General d'Armada e Exercito do mar Oceano e da Gente de Guerra de Portugal, etc.

Porquanto nas companhias que ficão de Prezidio para seguridade e defensa desta cidade convem nomear Capitaens, em quem se achem as partes que se requerem, de valor, pratica e experiencia militar e porque estas outras concorrem em vós, o Capitão Simão Leite de Amaral, havendo respeito que tendes servido a S. Magestade de oito annos a esta parte, os quatro premeiros nas armadas de Portugal e os demais na Armada do Exercito de Gibraltar. E sido Alferes nella e depois na do Oceano e Ajudante do Sargento-mór do Terço do Mestre de Campo Dom João de Orelhana e aveis vindo servir na prezente jornada do Brazil, assistindo em todo o sitio desta cidade até que se rendeo, cumprindo com vossas obrigaçoens, confiado que daqui em deante continuareis: hei por bem de vos eleger e nomear, como em virtude da presente vos elejo e nomeio por Capitão de hua das ditas companhias para que, como tal, uzeis e exerciteis o dito Officio com as honras, graças, mercês e immunidades que tem e gozão os demais Capitaens de Infanteria Hespanhola, e ordeno ao Senhor Marquez de Coprani, Mestre de Campo General deste Exercito vos faça dar e de posse da dita companhia e ao Sargento-mór Pedro Correa da Gama e demais Capitaens de Infanteria que ficão neste Prezidio vos hajão per Capitão da dita companhia e aos officiaes e soldados della vos obedeção como a sua cabeça, cumprindo as ordens que lhe dareis por escripto e de palavra, como as nossas proprias e os officiaes da Fazenda de Sua Magetade, a cujo cargo estão as Listas das ditas Companhias e de mais Gente deste Prezidio, fação registo desta nos livros dos seus officios para que se vos livre e pague o soldo de quarenta escudos cada mes, que hé o que vos tóca, por razão da dita Companhia, assim e da maneira que a demais Gente de Guerra de que vos mandei passar a presente, firmada de meo nome, selada com o selo de minhas Armas, referendada de meo infra escripto secretario.

Dada na Cidade do Salvador, Bahia de Todos os Santos, a dezanove de Junho de mil e seiscentos e vinte e cinco annos. Dom Fadrique de Toledo Osorio, por mandado de Sua Excellencia. Dom José de Sarabia. Cumpra-se e registe-se. -Barros. Concertei com a propria que tornei ao dito Simão Leite.-Bahia seis de Oitubro de 1625.-Gonçalo Pinto de Freitas.

Tambem foi nomeado sargento-mór e Governador da Gente de Guerra Pedro Correa da Gama, sendo exactamente os mesmos, os diseres com a seguinte alteração e em virtude da prezente vos elejo e nomeio por Sargento-mór e Governador de toda a Gente de Guerra do dito Estado pera que como tal uzeis exerciteis o dito Officio.

NOTA-16

Uma descripção da guerra hollandeza na Bahia, foi feita pelo illustre Antonio Vieira e por isso a transcrevo para melhor instrucção do leitor.

Annua da provincia do Brazil mandada á cidade de Roma, ao geral da Companhia de Jesus, de 1624 a 1625 pelo

Padre Antonio Vieira

Pax Christi. Ainda que a guerra algumas vezes não impede a pena, com que se escrevem os successos della, comtudo, outras vezes é ella tal, como esta, em que, nos achamos, que tudo perturba, e não dá lugar a escripturas, pelo menos as que são mais largas e requerem tempo e algum descanço. Por esta causa,até agora, se não escreveu, nem mandou Annua a V. Paternidade, desde o anno de 1624 para cá, e tambem porque não vierão relações dos outros collegios e casas e algumas vierão tarde, por falta de embarcações e difficuldades de navegação, que neste tempo tão trabalhosas forão e maiores que nunca; pelo que sou forçado dar a V. Paternidade conta nesta, do que succedeu nos dois

annos de 1624 e 1625 e ainda não de tudo, porque em todas as partes do Brazil, houverão taes sobresaltos, que impedirão de o notar e não derão logar a escrever.

Sustenta esta Provincia do Brazil, pouco mais ou menos cento e noventa Padres da Companhia, noventa sacerdotes, dos quaes trinta e um são professos de quatro votos, de tres solemnes, dous; e coadjuctores espirituaes formados vinte e sessenta e dois estudantes; coadjuctores cincoenta e destes, trinta formados; estão todos divididos em tres collegios, seis casas e treze aldêas, annexas ás mesmas casas e collegios. No collegio da Bahia residem commumente oitenta, no de Peranmbuco quarenta, trinta e cinco no do Rio de Janeiro, na residencia do Espirito Santo doze; na de Santos, cinco; sete na de S. Paulo; na casa de Ilheus, quatro; quatro em Porto Seguro, e quatro no Maranhão todos elles se occupão em alcançar a salvação e perfeição propria, e das almas, que é o fim de nossa Companhia.

COLLEGIO DA BAHIA

Com o grande trabalho, e má vida destes tempos, cahirão enfermos quasi todos os deste collegio, mas de tal maneira os repartio a Divina Providencia, que nunca faltarão sãos que servissem aos doentes no corporal e no espiritual e acudissem aos proximos. Destes enfermos passou á melhor vida o Padre Fernam Cardim, natural de Vianna de Alvito; Arcebispado de Evora, professo de quatro votos, varão verdadeiramente religioso, e de vida inculpavel, mas afavel e benigno, em especial para com seus subditos e a todos parece desejava e queria metter no coração e na alma, de todos se compadecia, a todos amava; prova estas suas grandes entranhas, o que pouco dias antes de sua morte, por occasião de reprehender um subdito, disse que nunca depois que entrára na Companhia tivera má vontade, a pessoa alguma nem escrupulos de tratar seus subditos com paixão, o que considerado tanto mais é, quantos forão os annos, que viveu na Companhia, em os quaes ordinariamente governou, e só os annos em que foi provincial e reitor passão de vinte. Estendia-se tambem esta sua caridade aos de fóra, como experimentarão e mais particularmente os presos da cadeia e os pobres do hospital porque a estes visitava a miudo, remediando suas necessidades com esmolas, por aquelles intercedia, solicitando suas causas como proprias e a todos finalmente ajudava, com muito grande amor e ardia tanto o divino no seu peito, que por Deus os servia, em Deus os representava e a Deus nelles. A seu corpo tinha odio santo, castigava com disciplinas em cada dia, sendo como era fraco e carregado de annos; mas a fraqueza do corpo sustentava com o esforço do espirito, madrugando todos os dias uma ou duas horas antes dos outros, as quaes gastava na presença do Santissimo Sacramento, a quem tinha muito particular affecto e devoção; communicava-lhe Deus aqui uma insigne magnanimidade, com que padecia trabalhos, resistia ás tentações, e vencia grandes difficuldades. Nesta desgraça da Bahia, era reitor, e por isso quebravão nelle mais todas as ondas das adversidades, mas como rocha viva sempre se conservou em paz, esteve muito firme e conforme com a vontade divina. Na sua ultima enfermidade, além das dores, e grande fraqueza, padeceu muita falta de todo o necessario; chegou pois aquella ditosa hora de se partir, a que elle todos os dias convidava sua alma, repetindo com muita devoção o profiscicere, anima christiani, exercitando-se e actuando-se na lembrança da morte; falleceu com grande dor e sentimento de todos, por se verem juntamente orphãos de pai e mãe, nelle tudo tinhão, porque pai os criava com sua doutrina e exemplo e como mãe piedosa entranhadamente os amava: comtudo por outra parte, sendo que lhe querião como filhos, ainda que com perda sua, se alegrarão de o ver fóra deste desterro. Entrou na Companhia no anno de 1555 mil e quinhentos e cincoenta e cinco de quinze annos de idade, viveu nella sessenta e falleceu de setenta e cinco, aos vine e sete de Janeiro de mil seiscentos e vinte e cinco.

Teve a mesma sorte o Padre Gregorio da Rocha, natural da Capitania de Pernambuco; tinha ao tempo em que Deus o levou para si trinta annos de idade, entrou no anno de mil seiscentos e onze de quinze annos na Companhia e nella viveu outros quinze annos, com satisfação e observancia religiosa; sabia bem a lingua da terra e melhor a exercitou nas aldeas, cultivando os Indios; era

enfermo de ordinario, e nas enfermidades mui animoso e paciente, em especial muita devoção e consolação de sua alma, recebeu todos os Sacramentos e falleceu a nove de Maio de mil seiscentos e vinte e cinco. No mesmo anno levou na ultima que foi mui trabalhosa e de grandissimas dores, entre as quaes com Deus para si o irmão Antonio Fernandes, natural da Ilha da Madeira, coadjutor temporal, com vinte e nove annos de idade, e des de Companhia da qua! entrara de dezenove, no anno de mil seiscentos e quinze; neste tempo viveu uma vida tão perfeita e exemplar com as paixões do corpo e alma tão mortificadas e sujeitas à razão, que não parecia homem, mas como muitos lhe chamavão Anjo encarnado. Neste collegio foi perto de oito annos enfermeiro, com caridade espantosa; trabalhava dia e noite sem descançar, assistia e acudia com maravilhosa e incansavel continuação a todos, sendo, como era, fraco de compleição. Neste ultimo trabalho da Bahia se apurou mais e resplandeceu sua caridade entre tantos enfermos e tanta falta do necessario mostrava quão engenhoso era, porque, sendo além dos doentes da casa, que forão muitos, muitos mais os Portuguezes sahidos da cidade e os Indios da aldea do Espirito Santo, onde residio e para todos dava mezinhas, a todos acudia e a todos visitava; finalmente fazia-se com tal espirito, que ainda os mesmos Indios, com serem menos entendidos, se não escondião e lhe chamavão santo. Não cuidava só nem curava só com remedios humanos seus enfermos, mas igualmente lhes appliçava os divinos, fazendo devoções particulares, por cada um e assim fazia curas mais que naturaes, como depois de sua morte se achou apontado em um livrinho seu que o Santo Anchieta dera saúde milagrosa a um Padre, o qual estava tão perigoso e em taes termos que ninguem julgou poder escapar.

Faltando a falla para se poder contessar a uma India, que estava na hora da morte, com suas orações lh'a alcançou de Deus. Não foi menos admiravel sua grande paciencia, e mortificação entre outros muitos, que curou de chagas asquerosas; foi um Indio ferido de um pelouro, com uma chaga de tão máo cheiro, que ninguem, nem o mesmo doente podia soffrer, nem seus parentes se atrevião a cural-o; mas como a graça é mais poderosa que a natureza, tinha este irmão tão vencida a sua, que com suas proprias mãos tratava aquella podridão, mostrando tão pouco asco, antes tanto gosto como se a materia fosse de rosas e flores mui cheirosas. E na verdade como taes estimava elle todas as cousas de mortificação, porque só a estas se pegara com muito gosto, estas erão seus passatempos, suas delicias e já com o continuo exercicio dellas parecia totalmente insensivel em particular nas mãos, as quaes tinha tão callejadas, que quando o assucar estava no ponto mais alto, mettia os dedos nelle, como em agua fria, e como se admirassem alguns, elle para dissimular, respondia com sua costumada prudencia, que lhe procedia do uso e continuação do fogo; mas que este fosse graça mais que natural, deixo ao juiso de quem o considerar, sendo experimentado nunca ao doente por mais importuno, e mal soffrido que fosse disse uma palavra, antes a todos consolava condescendendo com elles, no que não encontrava a saúde. Por embaraçado que estivesse e afogado em occupações, estava sempre sua alma tão livre e pouco perturbada, que por outras muitas que sobreviesse no mesmo tempo, a todos acodia o melhor que era possivel, sem mostrar enfadamento algum, antes com maior alegria, e a mesma tinha quando erão muitos os enfermos. Nunca se poude enxergar nelle um minimo signal de pouco soffrimento, ainda nas occasiões de o servir. Com ser tanto e tão continuado o trabalho deste irmão, quando as occupações The davão algumas breves treguas, não o acharião senão na Capella de joelhos, e aqui sem duvida ganhando forças para outros tantos trabalhos maiores. Na modestia, e recolhimento já raro, porque além de em casa ser um espelho de compostura religiosa, quando convinha sahir fóra enxergava-se-lhe um grande pejo, fazia-se como uma papoula, em tudo se perturbava, e o mesmo padecia, quando em razão de seo officio acompanhava o medico até a portaria, se era adiante de gente, então dava por causa disto sua pusilanimidade, que com esta e semelhantes capas cobria e disfarçava suas virtudes; destas e de muitas outras que sua humildade nos encobria tinha lavrada sua coroa, que a treze de Junho, dia de S. Antonio, cujas pisadas com o nome seguira foi possuir a gloria. Entre as cousas mais notorias, que deste bemaventurado se contão, foi uma que

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