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Guardai a nao de alli, ventos ligeiros.
Antes que tal fucceda, vê que gloria
Alcanças com deixar aos navegantes
Da tua ingratidao efta memoria.

Da noffa differença nao te efpantes :
Tu Nympha; eu Pefcador:Glauco,deos voffo,
Qual eu agora fou, tal era de antes.
Tambem eu entre as hervas achar posso
Aquella, a quem o Ceo deo tal virtude,
Que muda n'outro fer efte fer noffo.

Mas efte amor, que eu cá mudar nao pude, Inda que vá a morar lá neffas agoas, Nao temas que a mudança em mi o mude. Serao as vivas ondas vivas fragoas, Em que eftarei ardendo noite, e dia, Senao tiveres dó de tantas mágoas. As horas naturaes da pescaria

Nao vês que vao paffando? Como as paffas? Quem defte paffatempo te defvia?

Ah rigorofa Nympha ! Ah! Nao me faças Dar em vão tantos gritos: vem, iremos Ambos a levantar as verdes naças.

Ambos os anzoes curvos cobriremos De mentirofas ifcas, com que os peixes A todo prazer noffo prenderemos.

Affi de amor cruel nunca te queixes, E de effa formofura ás mais formofas Nymphas do mar azul vencidas deixes:

Que venhas (pois por ti com faüdofas
Lagrimas vou gaftando a vida, e alına)
A tirar-me efperanças duvidofas.

A praia eftá callada, o mar em calma:
A ii

Por

Por cima defta rocha brandamente
Zéphyro refpirando a defencalma.
Aqui nao finto coufa certamente
Porque deixes de vir, como foïas,
Senao, que nao es tu diffo contente.
Se defgoftas das graffas pefcarias,
Marifco appetitofo aqui não falta
Já fejam Luas cheias, já vafias.

Polos pés desta rocha dura, e alta,
Irei eu defpegando huus como pés
De hum pequeno animal, que nella falta.
E vivos te darei (fe delles es
Amiga) mil cangrejos vagarofos,
Que verás ir andando de revés.

Nao te darei ourizos efpinhofos,
Porque te quero tanto, que receo
Que effes teus dedos piquem tao mimofos.
Faz de aqui perto o mar hum largo feo
Onde de ameijoas lifas, fem trabalho,
Podemos apanhar hum cefto cheo.

Mas álém de tudo ifto hum crefpo galho
De vermelho coral te darei logo,
Que por dita arrastou o meu trefmalho.
Mas ai, q em vão te chamo,em vão te rogo,
Que nem tu a meus rogos tées refpeito,
Nem eu, por mais que grite, defaffogo.
Hum coraçao em lagrimas desfeito,
Como já nao te abranda? Quem encerra
Crueza tal em tao formofo peito?

Nao reina amor no mar, como na terra? Bem fabes que mil vezes já venceo A Neptuno teu Rei em clara guerra.

Suz

Sua formofa mái onde nafceo,
Senao no proprio mar em que te banhas,
Onde Tethys por Pelio em fogo ardeo?

Se das pedras nafceffes nas montanhas
Se com leite de tigres te criáras,
Mais duras nao tiveras as entranhas.
Apparecêras tu, e entao tornáras
Logo a efconder-te, logo, fe quizeras
Nas ondas, que de ti me fao avaras.

Com huma moftra fó que de ti deras,
A vida, que me foge em nao te vendo,
Co' os teus formofos olhos detiveras.

Entao víras os meus, donde correndo
De lagrimas fe vem dous largos rios,
Que o mar tambem em fi vai recolhendo.
Ah nefcio Pefcador! Que defvarios
Me deixo aqui dizer! A quem os digo!
A furdas ondas já, já a ventos frios.
Elles e ellas já crefcem: já em perigo
O barco vejo ai, ei-lo combatido!
Ellas e elles o levam já comfigo.

Olhos que lá me tendes o fentido ;
A culpa he voffa fó, que me nao vedes.
Mas pois o Pefcador anda perdido,
Perca-fe o barco feu, percam-fe as redes.

ADVERTENCIA DE FARIA.

Ha em toda efla Ecloga muitas cousas que eflao no manufcripto differentes do que Je ve na impreffao de Bernardes: nao as aponto por nao Jer neceffario: efta vai con

forme

forme ao mesmo manufcripto, porque nelle eftao melboradas algumas dellas. Ifto mef mo digo das quatro que fe feguem, pelo nao dizer em cada buma. Em todas apontarei Jómente os lugares, em que houver alguma confideravel differença, ou alteraçaõ.

ECLOGA X. DE LUIS DE CAMÕES,

PISCATORIA.

Ufurpada por Diogo Bernardes be a de cimaterceira no feu Lima.

Ncheo do mar azul a branca praia Melifo Pescador, de mil querellas; Melifo, que por Lilia arde, e desmaia. Defpois que á luz da Lua, e das estrellas; Sobre dura fatexa o barco posto, As redes recolheo, remos, e vellas:

Que gofto, ó Lilia, ( diffe) ou que defgofto Te move a me negar, vendo qual ando Teus olhos côr de Ceo, teu alvo rosto? Se tu queres que pene defejando; Se queres que no mar em fogo viva; Ardendo fempre eftè, fempre penando.

Mas olha, ó branda Lilia, (antes efquiva)
Que nao merece fer tao mal tratada
Huma alma, deffes olhos tao captiva.

Vives dos meus cuidados defcuidada:
Coitado de quem traz a duvidofa
Vida no mar e terra aventurada.

Bem

Bem podes com razaó fer piedofa Com quem nao quer mór be, q be quererte; Nao fendo tao cruel como es formofa. Ora deixa já ingrata, deixa ver-te A meus canfados olhos, que de tantas Lagrimas fao movidos, fem mover-te.

Se tu me vences e fe tu me encantas Com tua doce falla, doce rifo, Porque foges de mi, porque te efpantas? Lembre-te a formofura de Narcifo, E qual pago lhe deo feu defamor : Olha que com amor, difto te avifo.

Mas quando effa crueza tanta for, Que mereça do Ceo novo caftigo, Qual herva ferá digna de tal flor?

Amor que me perfegue, amor que figo, Me faz de hum grave mal andar temendo ; De hum mal, q eu finto na alma,e q nao digo. Quanto mais lédo já te eftive vendo, Aqui as manfas ondas esperando, Que por chegar a ti vinham correndo ; E da molhada area defpegando Com a candida mão roxas conchinhas, A fórma do teu pé nella deixando? Daquellas, de que tu mais gosto tinhas, Muitas te trago aqui, poftoque temo, Que menos o terás por ferem minhas. Hum temor tal me chega a tal extremo Que vencido do trifte efquecimento, No mar me cahe da mão o duro remo. E quando a branca véla fólto ao vento, Tao defcuidado vou do fiel leme

Que

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