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política do nosso país» seria José Bonifácio, no qual a grandeza maior «não é da eloquência incomparável do orador, é a da pureza e integridade do político» (4). É Joaquim Nabuco quem o diz. «Sua força provinha, tanto da fé que inspirava pela rectidão intransigente de uma alma inacessível à corrupção de qualquer espécie, pairando sempre na mais elevada esfera do pensamento e do sentimento humano, quanto do prestígio dêsse privilegiado talento e dessa eloquência inextinguível que, em vida, o tornaram o mais denodado paladino de todas as grandes causas liberais agitadas em seu tempo» (5). É o testemu

nho do Cons." Dantas.

Se a estes julgamentos políticos quisermos juntar o da opinião pública, ouviremos quem melhor e representava na imprensa do tempo, a Joaquim Serra. Era José Bonifácio «a mais espléndida inteligência dêste país, o coração mais nobre que jamais pulsou em peito de homem... «Não era uma força sómente porque a sua palavra fôsse um clarão, porque o seu carácter era uma claridade... «Quando aquela cabeça aparecia na tribuna do parlamento, como um globo de luz, àquela alma afinada no mais puro patriotismo desdobrava-se com a transparência de uma aurora. «Ninguêm teve entre nós tamanha magia na eloquên

(4) JOAQUIM NABUCO - O País, de 27 de Outubro de 1886. (5) Cons. MANUEL PINTO DE SOUSA DANTAS-Sessão cívica em homenagem a José Bonifácio, no Teatro S. José em S. Paulo, a 8 de Dezembro de 1886.

cia e nunca o astro da eloquência alçou-se aquela culminação... «Mas o que sobretudo o tornava invencível era a fortaleza de sua vontade, a fina tempera do seu carácter, a imaculada lisura daquela existència. «Era em sua máxima evidência, a oratória triunfante pela probidade do orador» (6).

DONS DE CORAÇÃO: 0 POETA

E «o poeta ? Quem poderia estudar aquela nolabilidade, sem deter-se, momentâneamente ao menos, com o poeta? Se Sócrates empregou a última parte da sua vida em purificar-se da mácula de haver desobedecido à voz interior, que não cessara de segredar-lhe: «Dá-te ao trabalho e à harmonia», em José Bonifácio a harmonia foi a musa assídua de uma existência de labor indefesso. Natureza essencialmente simpática, não lavrava a poesia como artefacto: vivia-a. O fundo do seu coração era de uma brancura imaculável e inefável sensibilidade. Não lhe faltou nem a invenção, nem a percepção, nem a emoção, que formam os grandes moduladores da idealidade humana» (7).

Tinha sua lira várias cordas: umas suaves, meigas, ternas, com que afagava blandícias e carinhos, outras tersas, sonoras, clangorosas, com que se exaltava em arroubos patrióticos. Talvez que, passado o romantismo, tenham calado muitos

(6) JOAQUIM SERRA - O Paiz, de 29 de Outubro de 1886. (7) RUI BARBOSA — Op. cit., pág. 20.

ecos, abafado muitos tons, demudado a graça ou o arroubo de muitas destas estrofes: elas conservam entretanto poesia, porque foram sentidas, embora num tempo em que havia exaltação nas comoções. Hoje em dia os poetas serão mais correctos na sintaxe, na versificação ou nas rimas, mais difíceis de gôsto nas ideas e nas imagens, mas, por isso mesmo, não serão tão sinceros nem tão espontâneos. O canto a Andrade Neves, O Redevivo, é uma glorificação; o lirismo gracioso e terno de Um pé ou do Meu Testamento caberá sempre numa antologia de poesia amorosa.

José Bonifácio foi feliz no lar, amando e zelando sua esposa e prima, D. Adelaide Eugénia de Andrada e Silva, de quem houve prole abençoada: quando ela passou, ela a quem tanta carícia publicada sem nome era consagrada, a quem tantíssimas outras prodigalizadas não conheceria o público, inspirava-lhe Os nossos sonhos, em cujas endeixas há como que um soluço disfarçado nas evocações, um apêrto demorado do coração, na tortura lenta da saudade...

Ia cumprir ainda sessenta anos, quando, sempre feliz!, teve o fim que ambicionava César, repentinum inopinatumque, morrendo súbitamente em S. Paulo, a 26 de Outubro de 1886.

Tinha alcançado todos os postos do magistério e da carreira política - professor de direito, deputado, ministro, senador, conselheiro da Coroa, presidente do Conselho, se o tivesse querido; talento, carácter, coração, abençoado por Deus e pelo Povo; mestre adorado e seguido, orador

aplaudido e vitoriado, poeta decorado e repetido; ia ter uma estátua... e quando tantos outros já envelheceram e passaram, esquecidos, Joaquim Nabuco dêle podia dizer, no dia imediato, ao do seu passamento: «é uma grande desgraça nacional, dessas que ferem de morte a esperança de uma geração inteira» (8)! Feliz José Bonifácio! A. P.

BIBLIOGRAFIA

Rosas e Goivos (poesias), S. Paulo (sem data: 1848 diz Sacramento Blake) — in-32.°

Memória histórica da Faculdade de Direito de S. Paulo, de 1858; S. Paulo 1859 — in-4.o

Discursos parlamentares publicados por João Correa de Morais. Rio, 1880, 614 p. in-8.o

Anais da Câmara dos Deputados, de 1861 a 1879. Anais do Senado, de 1879 a 1886.

Poesias de José Bonifácio, coleccionadas por José Maria Vaz Pinto Coelho. Rio Laemmert, 192 p. in-8.o (s. d. posterior a 1886).

Alêm dêstes livros várias edições de poesias avulsas, que foram aproveitadas nas duas edições.

As fontes para o estudo, rápido e breve, aqui feito, estão nos ANAIS DA CÂMARA E DO SENADO; nos necrológios, dos jornais de 27 de Outubro de 1886; principalmente em RUI BARBOSA - Discurso na comemoração cívica de 8 de Dezembro de 1886, 1 vol. in-8.o, 73 p., S. Paulo 1887.

(8) J. NABUCO, Op. cit.

POESIAS ESCOLHIDAS

DE

JOSÉ BONIFÁCIO (O MOÇO)

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